O futuro sobre rodas

Opinião de João Fróis

Num mundo muito pressionado pelas questões ambientais, vão saindo notícias positivas a cada vez maior ritmo e eis que a França, um dos países construtores de automóveis, afirma a meta de 2040 como o limite para venda de veículos movidos a combustíveis fósseis, vulgo petróleo.

Esta notícia, lida com ligeireza no meio da imensa produção de conteúdos do mundo atual, não nos diz desde logo as enormes implicações que uma medida a este nível terá no panorama geopolítico mundial. E serão muitas e de monta.

O petróleo continua a ser a principal fonte energética nos dias de hoje com a fatura tremenda do aumento da temperatura média global e que os governos tentam desacelerar, sob pena de se causarem danos catastróficos para a sobrevivência de todas as espécies nas próximas décadas.

Deixar de produzir veículos automóveis com motores de combustão é cada vez mais uma necessidade. Deixar de lançar os gases resultantes da queima dos hidrocarbonetos para a atmosfera tornou-se mais do que um objetivo, um imperativo, num mundo que já em 2008 superou a marca de um bilião de automóveis em circulação! Se em cada ano são produzidos mais de 70 milhões de novas unidades, conseguimos perceber o real impacto que uma medida destas terá não só nos níveis de poluição mas também na dependência energética e nas suas implicações políticas entre países e continentes.

França mostra uma vez mais que está na linha da frente das grandes decisões estruturantes que ajudam a mudar o mundo e os cursos da história.

País produtor de marcas como a Renault, que lidera a nipónica Nissan e a romena Dacia, o grupo PSA com a Peugeot e Citroen e que recentemente comprou a Opel alemã, com inúmeras fábricas pelo mundo, terão assim um impacto profundo na arquitetura europeia e mundial da mobilidade e da produção e gestão energética. A Alemanha, principal produtor europeu de automóveis, já apresenta em todas as suas marcas opções elétricas e hibridas e o Japão, outro dos gigantes produtores desde há muito que tem veículos híbridos que combinam consumos de hidrocarbonetos e eletricidade e se lançam no projeto do hidrogénio, já em circulação na Europa e com autonomias acima dos 400 quilómetros.

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Dizem-nos estes dados que o paradigma mudou e que é já uma questão de tempo até as energias renováveis serem a matriz da mobilidade mundial. Naturalmente haverá prazos de adaptação e substituição dos veículos antigos, movidos a combustíveis fósseis, assim como com elevado grau de probabilidade, assistiremos a um mundo a duas velocidades, com os países mais desenvolvidos a se locomoverem em veículos limpos e alimentados a energia elétrica e hidrogénio e a um bloco de países em desenvolvimento que irão manter por mais tempo os automóveis ainda movidos com base em produtos petrolíferos, gasóleo, gasolina e gás.

A data avançada por Paris pode até ser adiantada, tais são os avanços tecnológicos na autonomia que as baterias propiciam aos veículos elétricos, bem como a pressão política e das ONGs ambientais que pedem a maior celeridade nas transformações dos paradigmas energéticos e que possam assim contribuir em muito para desacelerar o aquecimento global do planeta.

Curioso será assistir à atitude dos países da OPEP uma vez que grande parte da sua riqueza está na produção petrolífera e se é certo que continuarão a haver muitos produtos a serem feitos com base no crude, o abandono progressivo mas imparável do consumo do mesmo por milhões de veículos circulantes, terá um impacto profundo e dificilmente mensurável a esta distância. Mas a Europa sabe que este é não só caminho de aliviar a pressão sobre o planeta mas também em muito, a via de libertação da dependência energética de países terceiros, facto que terá substanciais e até dramáticas implicações na economia mundial e nas relações de poder entre blocos comerciais e políticos.

Vejamos então que resposta darão os países produtores de petróleo. Se se irão adaptar e orientar-se para as energias e tecnologias limpas ou se, pelo contrário, vão forçar o uso e consumo de crude para manterem as suas fontes de riqueza o máximo de tempo que conseguirem?

As respostas seguirão em breve mas o curso da história está lançado e as mudanças serão cada vez maiores, chegarão mais rapidamente e terão impactos mais poderosos na forma como vivemos e consumimos.

O planeta pede homens corajosos, decisores inteligentes e caminhos mais limpos e seguros. Todos dependemos das decisões que estão a ser tomadas hoje. E as respostas começam em cada um de nós. Que 2040 possa ser 2030.

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