Opinião

308 votos de confiança

"E em boa verdade estas eleições de proximidade trazem consigo uma identidade que as legislativas dificilmente comportam. Cada candidato é conhecido na sua terra, pelo seu percurso pessoal, académico e profissional e pela sua vida pública em geral, humanizando a personagem política". Por João Fróis

By Jornal de Cá

October 08, 2025

“Não consigo confiar em nenhum político”, foi a frase que ecoou na rua, numa conversa como tantas outras ao fim de tarde entre amigos. Mais do que o habitual “são todos iguais”, a confiança foi a pedra de toque na observação do espectro político português e neste caso a propósito das eleições autárquicas do próximo dia 12 de outubro.

E em boa verdade estas eleições de proximidade trazem consigo uma identidade que as legislativas dificilmente comportam. Cada candidato é conhecido na sua terra, pelo seu percurso pessoal, académico e profissional e pela sua vida pública em geral, humanizando a personagem política. Há obviamente vantagens e desvantagens nesta proximidade e conhecimento social do candidato, mas é a confiança que marca a notoriedade e potencial do projeto levado a votos. Quando olhamos um cartaz com um ou mais rostos, nesta profusão de equipas robustas e bem alinhadas a toda e qualquer freguesia, tentamos perceber a dimensão real por detrás daquela foto, melhor ou pior conseguida. Os slogans são vazios de conteúdo e quase tudo se joga na imagem e na confiança que transmite. O que não deixa de ser curioso e até paradoxal numa sociedade e mundo altamente desconfiados da própria sombra.

Mas nos 308 municípios as realidades são contrastantes. Os partidos concentram o foco em Lisboa e Porto, pelo seu mediatismo e importância política, no peso das regiões metropolitanas e nas influências dentro dos aparelhos internos. Mas se aí temos o tal distanciamento próprio das eleições legislativas, onde não existe uma ligação entre o candidato e o eleitorado, na maior parte dos demais concelhos da província a história é bem diferente. O peso dos partidos dilui-se face à notoriedade dos candidatos. Os exemplos dos que saem dos partidos para irem a votos como independentes mostram, sem filtros, esta mesma expressão do potencial diferenciador da personalidade e da confiança que gera no eleitorado, esvaziando o pretenso poder do partido. As eleições autárquicas trazem em si o desconforto original para a própria razão de ser dos partidos, ao permitirem a ascensão do indivíduo e lhe propiciarem a oportunidade de derrotar a máquina partidária e as suas (i)lógicas manobras de bastidores.

Cada candidato independente traz consigo a virtude de se poder afirmar nas suas ideias e valores e de verdadeiramente se debruçar no serviço à população, para lá dos alinhamentos estratégicos que cada partido sempre obriga e que tantas vezes criam um fosso entre o eleito e os eleitores. Se o consegue interpretar ou se resvala para qualquer compadrio ou alianças menos nobres cabe a cada um decidir a todo o tempo ao longo do mandato. Mas a ocasião existe e no próximo domingo esses jogos irão ser disputados até ao último minuto. Este ano com a novidade da forte presença do Chega a nível autárquico e que poderá confirmar a boa performance nas legislativas. Neste particular o peso do partido e sobretudo do seu carismático líder poderá distorcer o capital de confiança que habitualmente faz a diferença a nível concelhio, promovendo a ascensão de anónimos à boleia da ventura do líder. Esta será certamente a grande dúvida que amedronta muitos dos candidatos dos demais partidos em muitos dos concelhos onde o novel partido mostra força e expressão. Haja sobretudo espírito cívico e democrático entre todos os participantes. Votos de umas boas eleições.