Opinião de João Fróis
Portugal sofre de uma doença generalizada e que habitualmente anda de mão dada com uma total e aberrante falta de vergonha, a amnésia.
O português comum há muito que demonstra ter memória curta, quando insiste em votar nos mesmos partidos dos quais se queixou durante anos, pelos males governativos que direta ou indiretamente o afetaram. Face a esta memória vã e repetidamente fraca, os sucessivos governos vão gerindo as suas ações sem grandes preocupações com eventuais chamadas à colação pelos mais atentos ou com reais interesses na denúncia de qualquer uma das imensas malfeitorias que vão fazendo a esta nação de treinadores de bancada. Ralham muito mas poucos se chegam à frente.
Os escândalos políticos sucedem-se e parece que a vergonha não tem limites na ação de governar os destinos da república. A polémica recente, que deveria abalar o executivo e eventualmente pô-lo em causa, das inúmeras nomeações de familiares para cargos políticos e governativos é apenas mais uma acha na imensa fogueira de impunidades tamanhas e nepotismos a emoldurar o fartar vilanagem do erário público.
Se dúvidas houvesse que quem nos gere nos olha como verdadeiros tansos, desenganem-se os mais otimistas e crentes nas virtudes dos “serviçais da coisa pública”. Basta atentar à imensa amnésia que tolda os políticos quando chamados a de alguma forma prestar contas. José Sócrates por várias vezes veio tentar justificar o injustificável e a sua legião de crentes não diminuiu, espantosamente. Zeinal Bava pareceu já nem se recordar que presidiu em tempos à PT e que a levou a um quase ko técnico. Carlos Costa não se recorda de terem sido feitos investimentos de risco com o dinheiro do accionista Estado, ou seja, de todos nós. A lista é grande e não cabe aqui nomeá-la. Aliás os intervenientes são quem menos interessa ao caso, até porque entre o deve e o haver podem sair a perder nesta contenda, entre o histerismo justiceiro das redes sociais e a habitual lentidão da justiça, ardendo nos entretantos e quiçá perdendo a honra que alguns ainda ostentam. Haverá aqueles que também pouco se lembrarão o que este vocábulo significará.
A pergunta que se impõe é tão somente, até onde vão levar o desplante, a aberração, a sem vergonha? Temo que a habitual cobardia e conformismo lusos se imponham à voracidade feroz dos justiceiros digitais e que nada mude, permitindo que as teias de interesses e interessados continuem, alegremente, a dividir para reinar.
Cada vez mais o Estado se afigura como um abono de família para uma imensidão de gente a quem a incerteza do mercado de trabalho deve causar calafrios de morte. Em tempos de mudanças radicais no setor privado, em que o amanhã é uma dúvida constante, nada como procurar o abrigo do estadão paternalista e singrar numa via sempre ascendente, sem os receios naturais que assolam o trabalhador comum e que mais do que porfiar tenta acima de tudo sobreviver.
A democracia lusitana anda mal frequentada e não mostra sinais de melhoras. E a pior imagem que passa para a opinião pública é contundente e degradante ao mostrar, em diversas ocasiões, que é “fraca com os fortes e forte com os fracos”. Ser português é cada vez mais ser contribuinte, consumidor e votante. De boca fechada, preferencialmente! Pensar é um exercício que não interessa a quem vai mandando.
Pensemos pois. E lutemos pelos ideais que daí resultem. Antes que seja tarde de mais.