A capacidade de uma terra se reerguer

Opinião de Miguel Montez Leal

Para quem goste de História é consciente, que o Cartaxo, assim como o País, já passou por inúmeras crises, mas sempre as conseguiu, mais ou menos, superar.
Historicamente, e apenas começando no século XIX, o Cartaxo sofreu em 1807, com a invasão de Junot; em 1810 com as tropas de Massena; foi-quartel-general de Wellington, entre 1810/1811; suportou e ajudou na Guerra Civil, os liberais, na Batalha de Almoster (em 1834), aqui tão perto, e dividindo as famílias de cartaxeiros, entre miguelistas e liberais. A partir da década de 1840 (altura em que Garrett vem ao Cartaxo e escreve as suas Viagens na Minha Terra) a terra começa novamente a reerguer-se, até aos anos 80, época em que a Monarquia entra em desgaste, devido sobretudo ao Ultimatum inglês e a uma presença portuguesa muito ténue e frágil nas colónias africanas. Depois, republicanos, maçons, lavradores abastados, comerciantes, farmacêuticos e homens dos ofícios começaram a preparar a terra para a instauração da República. Nos primeiros anos da República, os progressos foram úteis, embora desagradassem à larga maioria de um povo conservador, atávico e imobilizado, depois, pouco a pouco, a Primeira República (1910-1926), foi-se revelando uma decepção, com perseguições, golpes e contra-golpes, e existiriam 45 governos no espaço de dezasseis anos. Ainda agora nos queixamos nós?!
Poderia continuar pelo século XX fora, mas a História é recente, e mais ou menos conhecida de todos. E agora em 2014, depois de uma terrível crise internacional, do desgoverno de um penúltimo primeiro-ministro e acólitos, da instalação da troika e da sua partida em avião flutuante, Portugal tem pouca margem de manobra, e o Cartaxo, igualmente, com a pesada dívida que herdou.
O Cartaxo, sendo também a terra do vinho, que já não é tanto, produz em menor quantidade, mas com muito melhor qualidade. O carrascão tem os seus dias contados! Mas o vinho, não pode ser a sua única marca identitária, pois a toda à sua volta, desde Aveiras a todo o Oeste, e na margem Sul, toda as terras, são terras de vinho. O que podemos então fazer?
Em primeiro lugar, uma urgentíssima mudança no trânsito (não faz sentido circular por rotundas que nos atiram mais para fora, do que para dentro); em segundo lugar, reforçar a limpeza urbana e a instalação de sinalética turístico-cultural; em terceiro lugar, através da Cultura, que é o petróleo do século XXI, mas não só através de folclore e touradas. Já alguém fez uma sondagem para auscultar os gostos musicais dos cartaxeiros? Em quarto lugar, e o mais difícil, tentar criar condições de atractividade para os negócios e empresas: baixar impostos (o que agora será praticamente impossível); desburocratizar e acelerar os processos administrativos; isentar algumas casas, ou partes de freguesias, e por fim, o principal, conseguir, por todos os meios, uma boa ligação ferroviária a Lisboa, com horários racionais, e úteis, pois já somos um subúrbio lisboeta, embora não o admitamos. As gerações entre os 25 e os 45 anos, deixam o seu automóvel na Azambuja, e embarcam no comboio naquela vila em direcção à capital.
Então unamo-nos, deixemos a má-língua provinciana e destrutiva, e por isso tão pouco mobilizadora, e tentemos dar, cada um de nós, o seu melhor. Nesse dia, talvez, o Cartaxo se erga novamente. Será com as novas gerações, sempre com as novas, ainda sem passado e não viciadas em jogos de poder e protagonismos ocos, que a terra se poderá reerguer.
Recordem-se que tudo é efémero, e o poder, “o maior de todos os afrodisíacos”, ainda mais. E, também, que as notas de rodapé são extensas, e pouco lidas e o corpo de texto curto.

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