A Europa do nosso descontentamento

Opinião de Renato Campos

Faz 30 anos que Portugal assinou o tratado de adesão à Comunidade Europeia, tendo entrado, de facto, em 1 de janeiro de 1986. Não já com a pompa e circunstância de então, mesmo assim era suposto que hoje a efeméride fosse comemorada. Todavia, esta data tem passado despercebida mostrando o desinteresse da maioria dos portugueses. No entanto, na altura a construção de uma europa unida (martirizada em meio século com duas grandes guerras), era considerado um projeto entusiasmante e mobilizador inspirado nos seus grandes ideólogos, Jean Monnet, Robert Schuman e Konrad Adenauer.

A eliminação de barreiras dentro da europa; a melhoria das condições de vida e de trabalho dos seus povos; o reforço da unidade e convergência das economias; a promoção de um desenvolvimento harmonioso e a redução das desigualdades das regiões e países menos favorecidos constituíam os pilares essenciais da construção de uma nova europa mais desenvolvida, solidária e pacífica. Claro que, tal projeto exigiu a liderança de políticos de exceção. Tudo foi correndo de feição e as verbas do FEDER foram alimentando a mística europeia, conduzindo em 1992 a um novo Tratado – Maastricht – que criou a União Europeia, projeto muito mais integrador alicerçado numa moeda única, o EURO.

Se bem que no princípio as coisas parecessem correr bem, entusiasmando e promovendo a entrada de novos Estados, o certo é que com a criação do EURO, começaram as primeiras contradições da UE. Com as regras previamente definidas em função dos interesses dos Estados economicamente mais fortes, sobretudo com um euro sobrevalorizado concebido à semelhança do “marco alemão”, os chamados “países do sul”, possuidores de uma estrutura económica mais frágil, começaram a demonstrar crescentes dificuldades em as cumprir. A falta de líderes europeus e a adoção de políticas erradas de uma generalizada austeridade e subservientes ao capital financeiro mundial levaram, progressivamente, ao agravamento das desigualdades entre Estados membros e povos.

Esta realidade faz temer o fracasso geral deste projeto. A Grécia, Portugal, Irlanda, Espanha, Itália, Chipre e mesmo a França, não escondem um progressivo declínio, e são obrigados a reduzir as funções do Estado Social, cortando no investimento público e desvalorizando cada vez mais os custos do trabalho através da precarização dos laços laborais. Mesmo no seio da U.E. as consequências dessa austeridade fanática também se vão generalizando. Um em quatro europeus está em risco pobreza ou exclusão, e mesmo na Alemanha esta relação é assustadora. Também a Europa, por sua vez, não se pode transformar numa “prisão financeira” para os seus Estados, nem numa cortina de arame farpado para os povos. Nada disto, afinal, se coaduna com os ideais e pilares programáticos que levaram à constituição da União Europeia.

Os europeus e o mundo, precisam urgentemente de uma Europa desenvolvida, solidária e baluarte da defesa dos direitos humanos e civilizacionais.

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