Opinião de João Fróis
Há mais de duzentos anos, Jean Jacques Rosseau afirmava que “homem que não conhece a dor, não conhece a ternura da humanidade”.
Este filósofo percursor do Iluminismo, afirmava assim uma verdade essencial que é transversal a toda a evolução humana, a experiência do sofrimento como grande escultor da alma social do indivíduo.
Após um século XX dramático, com guerras mundiais e regionais, regimes ditatoriais e sangrentos e crises económicas profundas, este novo século prometeu mudanças mas mostrou que a construção da evolução continua a ser dura e até insuportável para milhões. Atentados das torres gémeas, guerra do Golfo, crise do sub-prime e agora a pandemia mundial, marcam os primeiros 20 anos de um século que ameaça o colapso ambiental e civilizacional.
Pelo meio, as pessoas. Num mundo desigual e fracturante, somos todos nós que vamos sofrendo as agruras de um modelo civilizacional que separa mais do que une, que cria mais pobreza que riqueza e que semeia mais injustiça e infelicidade que o seu contrário.
A pandemia tem afetado imenso a economia e as vidas de milhares de pessoas que dependem do seu bom curso. São agora as instituições que são chamadas à liça para responderem e ajudarem a salvar e recuperar um equilíbrio que se percebe estar no fio da navalha.
Pelo meio, as pessoas. E perceber como cada um responde às privações e dificuldades de algo que exige sacrifícios tamanhos, a começar pela separação física entre família e amigos, no respeito a um bem maior como o é a salvaguarda da vida humana.
Independentemente da confissão religiosa que se professe ou a sua ausência, a verdade é que nesta quadra o espírito é fraternal e desperta em cada um de nós o melhor que temos, e a humanidade, essa condição maior que nos permitiu evoluir como sociedade, figura no centro de todos os sentimentos de partilha e união.
Estar separado é agora uma exigência social e que cada um incorpora com o bom senso e respeito que aprendeu a ter pelo outro, seja próximo ou distante. O desafio é enorme e oscilamos entre o desejo profundo da velha normalidade, com tudo o que de afeto e proximidade traduz, e as obrigações que nos toldam os movimentos, os abraços e celebrações, isolando-nos.
Não sabemos se a sociedade irá aprender algo com esta crise pandémica, mas no registo individual todos nós temos esse caminho a trilhar. Há que aprender com a dor e dar mais espaço e valor à humanidade que faz de nós estes seres complexos mas infinitamente simples no que mais nos aproxima, o amor e o sentido maior que a união e partilha trazem à vida de todos nós.
Humano provém do latim “homem sábio”. Saibamos ser sábios na vivência da nossa humanidade.
*Artigo publicado na edição de janeiro do Jornal de Cá.