A implosão da humanidade

Por João Fróis

Por estes dias o centro do mundo mediático ficou preso ao destino de um pequeno submarino, com cinco pessoas a bordo que se aventuraram a descer às profundezas do oceano para vislumbrar os destroços do famoso navio Titanic, afundado em abril de 1914. O tempo de antena dedicado a esta excursão abissal captou a atenção do mundo como se o destino da humanidade estivesse nas mãos daqueles milionários, entretanto desaparecidos na imensidão oceânica. Em contraste absoluto, o naufrágio de uma embarcação de migrantes ao largo da Grécia, onde apenas sobreviveram 104 pessoas de um total estimado de 750, apenas mereceu breves notícias, como “apenas” mais um triste episódio de uma saga mortífera que desde 2014 já ceifou mais de 27 mil vidas no mediterrâneo.

Serão estas 5 pessoas mais importantes que 750?

Eticamente não. Mas mediaticamente são. E esta oposição de valoração da vida consoante a origem de cada uma, leva-nos a um afundamento civilizacional e a uma trágica implosão da humanidade.

De um lado 4 milionários e o filho de um deles, do outro centenas de invisíveis migrantes, com dezenas de crianças e mulheres desesperados. As faces do dinheiro e as da sua absoluta carência. O luxo da diversão e o risco da fuga. A busca excêntrica da fruição e a busca da sobrevivência. Assim está o mundo. Caótico, sob uma enorme pressão ambiental e climática, com cada vez mais milhões de pessoas sem acesso a água e alimentos, a fugirem de guerras intermináveis e em desespero, arriscando a vida em travessias sem condições de navegabilidade. No outro quadrante, vemos os milionários, sem preocupações mundanas e a arriscarem as suas vidas para aumentar a adrenalina e o sentido das suas vidas opacas.

Na mitologia da Grécia clássica encontramos os titãs, entidades gigantes criadas pela deusa Gaia para a proteger e fomentar a paz e união no mundo. No entanto estes seres enfrentaram Zeus e os demais deuses na sua ascensão ao poder.

Tal como estes titãs, nem sempre a sua génese tem a consequência esperada. E neste mundo á beira do colapso, com a emergência de decisões e missões titânicas que o salvem, assistimos á deificação do dinheiro em aberrante contraste com a progressiva desumanização. O valor da vida humana está em queda absurda juntamente com os valores e princípios éticos que a definem e sustentam. Singram os bilionários e definham os pensadores e filósofos. A ascensão estúpida do capital está a ser feita sobre os cadáveres do pensamento crítico, do livre arbítrio e dos direitos humanos. Será esta a face demoníaca da tão propalada 3ª guerra mundial. Um mundo desumano, desigual e injusto que engole a vida humana e vomita cifrões. E se o futuro se afigura terrível, com uma enorme probabilidade de implosão da vida tal como a conhecemos, não haverá sequer quaisquer deuses do Olimpo que nos salvem da tragédia. A epopeia humana poderá estar triste e lamentavelmente próxima do seu fim.

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