A perigosa dependência

Opinião de João Fróis

Bastaram três dias de greve dos distribuidores de substâncias perigosas para deixar Portugal em alerta. Já na véspera de Sexta-feira Santa, a manhã trouxe a boa nova de um acordo que fez cessar esta greve mas os efeitos da mesma dão que pensar.

Na verdade sabemos há muito da enorme dependência energética deste modo de vida moderno. Consumimos energia a rodos sem sequer nos determos na origem da mesma. As preocupações, quando as há, surgem na hora de pagar a fatura. Até lá é atestar depósitos, ligar ar-condicionado, todo o tipo de aparelhos eletrónicos que estão constantemente na tomada e a vida segue logo ali, na vertigem dos dias.

Uma greve como esta priva-nos desde logo de algo que normalmente damos por adquirido, viajar no nosso automóvel, esse arauto da mobilidade individual e que continua a ser um ícone da diferenciação face às massas que se deslocam, por opção ou por não terem alternativa, em transportes públicos. Assim e face à privação do velho e poluente combustível fóssil que continua, pasme-se, a ser a grande fonte do movimento de quase toda a economia, instala-se o caos num abrir e fechar de olhos. As filas na busca desse “precioso” motor liquido das estilizadas viaturas que insistimos em glorificar, mostram quão dependentes estamos das teias que fomos criando. Os equilíbrios são frágeis e dependentes de fatores múltiplos que tantas vezes não controlamos e que as alterações climáticas nos vão fazendo lembrar cada vez mais amiúde.

Três dias bastaram para haver pânico. Imaginemos então uma crise mundial no abastecimento de produtos petrolíferos quando o mercado ainda é prevalente no uso e abuso desta odiosa fonte energética. Seria qualquer coisa de dantesco pois os circuitos de distribuição iriam parar e o abastecimento dos produtos alimentares cessaria em poucos dias. A partir daqui todos os cenários, de guerra ou similares, são ponderáveis. Sabemos já que o ser humano, quando privado do essencial se transforma (ou deixa emergir) a sua face selvagem, brutal e assassina. Há exemplos desta bestialidade neste mundo a cada ano que passa e com os problemas que o aquecimento global garantidamente vai trazer, as piores perspectivas poderão ser o dia a dia dos nossos netos, uma luta cerrada pela sobrevivência!

Andamos entretidos a gozar as benesses desta sociedade de consumo e temos por garantida a qualidade de vida que a mesma proporciona,
não a todos mas aos que tiveram a felicidade de nascer nos países mais ricos e, nestes, terem tido acesso ao melhor que proporcionam. E só quando algo precioso nos falta, nem que seja por pouco tempo, nos lembra a importância dos equilíbrios de que dependemos. Toda a economia assenta numa lógica de oferta e procura de bens e serviços que por sua vez dependem de toda uma rede logística de distribuição que assegura que cada coisa esteja onde é esperada estar. Quando falta e não há opções instala-se o caos.

Imaginemos o que seria se a internet, onde todos os sistemas públicos e de gestão dos serviços essenciais estão assentes, tivesse um crash a nível mundial? Cairíamos numa quase idade da pedra e seria o salve-se quem puder. Acreditemos que os sistemas de segurança impedirão este cenário apocalíptico mas é bom não termos garantias absolutas. Uma simples greve deixou-nos à beira de um ataque de nervos. Daí para a frente tudo seria pior, até níveis inimagináveis.

Ler
1 De 425

Episódios como este lembram-nos igualmente que o petróleo já há muito não deveria ser a solução e que as alternativas têm necessariamente de acelerar a sua disponibilidade e acesso fácil a todos. Para o bem do planeta e de todos nós.

Isuvol
Pode gostar também