A 13 de Maio, dia intimamente ligado às aparições de Fátima, o Papa Francisco visitou Portugal. Nos cem anos das comemorações religiosas das vidências, canonizou dois dos pastorinhos e celebrou a fé católica na imagem e presença da mãe de Jesus. Crentes e não crentes respeitam a fé e a força da sua representação simbólica. A ciência explica hoje a energia transformadora e positiva da espiritualidade e essa, para alguns milhões, teve no sábado um dia de imensa felicidade e afirmação neste altar religioso do mundo que é hoje Fátima.
Neste mesmo 13 de Maio, o Sport Lisboa e Benfica venceu novamente o campeonato de futebol e sagrou-se tetracampeão, feito inédito na história do maior clube português. Foi uma festa enorme que se espalhou além fronteiras e por todos os países onde há portugueses. O 36º campeonato é igualmente o que ficará como aquele em que o eterno Benfica alcançou os quatro títulos consecutivos. A felicidade dos sócios, adeptos e simpatizantes foi esfuziante e dificilmente será esquecida por mais anos que passem.
E ao final da noite, neste mesmo dia 13, Salvador Sobral subiu ao Olimpo do festival da Eurovisão, ganhando com mérito algo nunca antes sonhado desde que há memória. A música autêntica, simples e cantada na nossa bela língua pátria reconciliava-se enfim com essa portugalidade que nunca antes se encontrara consigo própria. A felicidade deu as mãos ao orgulho nacional e foi todo um povo a comover-se com o jeito singular daquele rapaz genuíno e de uma simplicidade desarmante que tão bem nos representou.
Muito se falou nos três F’s, de Fátima, Futebol e Fado, nesta caso, adaptado a Festival. E essa memória nada tem de mal pois a ligação ao antigo regime é falaciosa, nunca tendo Salazar gostado do culto à virgem, apenas o tolerando, não sendo particular adepto do desporto rei nem tão pouco grande fã de música. Mas esta trilogia de fé, futebol e música assenta bem ao povo, assim como a felicidade que lhe proporcionou. Merece-a por inteiro e deve, pois, celebrá-la a preceito. Sem olhar a preconceitos nem a grilhões, nem tão pouco a falsas modéstias ou pudores. Ser português é hoje motivo de orgulho e as mais recentes conquistas internacionais vieram prová-lo a quem tinha dúvidas ou sentimentos de uma qualquer inferioridade face a outros mais poderosos economicamente.
E é precisamente na economia que devemos debruçar-nos. Não para fazer desta a primeira das nossas preocupações mas sim, olhando para as suas fraquezas, sentir o prazer genuíno que a fé, o futebol e a música, entre outros, nos podem proporcionar. Não é o dinheiro que traz a felicidade como tanto se apregoa e bem, e sendo este condição de sobrevivência, são as coisas intangíveis, perenes e inesperadas que nos apaixonam, nos comovem e alegram a existência. O dinheiro compra coisas, põe pão na mesa, assegura-nos. Mas a felicidade advém de sentimentos que vão muito para além dessa materialidade opaca.
A fé move verdadeiramente montanhas. Senão as de rocha, as dos sacrifícios tamanhos que levam gente de todas as condições a palmilhar centenas de quilómetros em busca de redenção e reencontro consigo próprios. A estada até ao santuário é uma via redentora e rejuvenescedora da alma, em contraponto com o fatigado corpo, libertando o espírito das dores mundanas e das limitações humanas. Também no futebol a fé é imensa. A comunhão entre gente de todas as raças e credos é total, sob um mesmo emblema, um mesmo desejo de conquista, superação e glória. A felicidade libertadora de cada golo, rumo à ambicionada vitória é inigualável e nenhum adepto trocará esta alegria da obtenção de um tetra campeonato pelo seu clube por qualquer regalia material por mais vultuosa que seja. A glória e fruição são maiores e nada se lhes compara.
E que dizer da conquista de um euro festival onde a tradição foi sempre a de lá conseguindo chegar tentar não fazer má figura. Alcançar a vitória tem tanto de inusitado como de merecido. E num certame onde a vertente do espetáculo sempre foi rainha, foi admirável ver tanta gente apaixonada pela simplicidade desarmante de um Salvador autêntico, singular e poético no cantar e teatral nos gestos e expressões. Adoça o coração sentir que tanta gente ficou emocionalmente ligada a uma canção melodiosa e a um intérprete que ousou cantar na sua língua pátria. E que mesmo não percebendo na hora a bela letra que Luísa compôs, ficou ligada à energia poderosa que emanava de tal interpretação maior. A felicidade lusa entregou-se no sonho de um menino que foi genuíno e inteiro e soube encantar pela enorme simplicidade um mundo que nos entope de plástico, de medíocre futilidade e da vertigem utópica do sucesso imediato.
Foi uma vitória da fé que fez de Portugal um País feliz a 13 de Maio. A fé religiosa tão ilustremente personificada num Papa humanista, simples e próximo das pessoas que mais precisam, fazendo dos seus gestos toda a enorme missão maior da Igreja que os homens dedicam a Deus.
Fé clubística e que neste caso honrou o SLB, o clube mais titulado em Portugal e que granjeia adeptos por esse mundo fora. A missão era alcançar o nunca antes conseguido, o tetra, e toda a “nação benfiquista” estava com a equipa, dando aos seus heróis do relvado a força imensa para lograrem chegar ao seu objetivo. Foi nesse espírito de união e fervor que a vitória foi alcançada e a felicidade partilhada numa cidade e País pintados de encarnado.
Fé num cantor singular que foi ganhando dentro de portas e depois a presença na final. Nos tempos das redes sociais e do imediatismo da informação foi-se percebendo o sucesso que “amar pelos dois” estava a granjear por esse mundo fora e foi com uma saborosa expetativa que se avançou para uma final épica e memorável. A fé na música que ama e canta ficaram expressas indelevelmente em cada esgar e trejeito de Salvador Sobral e esse estado de graça conseguiu chegar aos corações de milhões de pessoas, em dezenas de países.
E Portugal conseguiu, num mesmo dia, ter três enormes manifestações de felicidade. Diferentes entre si, a tocar pessoas igualmente distantes e diversas nos seus credos e formas de vida mas com um denominador comum, a intangibilidade própria do sentir e a felicidade que o espírito conhece e comunga entre pares, numa partilha de vontades, de desígnios, de missões de vida, de superação e regozijo por “tão só” fazer bem aquilo que se ama!
Parabéns Portugal!