Abril em Portugal

Por Pedro Mesquita Lopes

Citando parcialmente um dos muitos homenageados no mês de Abril: em verdade vos digo que até hoje só escrevi estas crónicas sempre no último dia do prazo. E esta ainda não é exceção. Defendo-me, ou melhor tento convencer-me, com a justificação que o faço para estar mais próximo dos acontecimentos que aqui trago, mas o facto de, por exemplo, iniciar esta crónica com a alusão a uma figura que viveu há cerca de dois mil anos é prova provada que esse argumento não colhe…

A verdade é que estou a escrever aqui e agora e se tinha pensado escrever sobre ou com alguma referência ao dia das mentiras não o vou fazer e em vez de usar uma possível quadra de um putativo poeta popular da nossa praça, “Dia um de Abril é dia de tradição, é o dia em que se pode mentir sem esperar reprovação”, vou antes usar outra expressão idiomática do mesmo e seguir o seu muito repetido conselho: “Segue o que sentes” (mesmo que partas os dentes).

E o que sinto é que em Abril podemos, devemos!, sempre lembrar e homenagear Salgueiro Maia, o homem que, para mim, simboliza o 25 de Abril, pois se bem quis e atuou decisivamente para, como ele disse, “acabar com o estado a que chegámos”, também foi homem a quem não podemos apontar o que quer que seja de responsabilidade para o estado em que estamos. E isso não se deve a ter morrido novo ou há muitos anos, isso deve-se a ter sido uma pessoa íntegra e séria. Além disso – agora talvez já esteja a entrar por campos minados, mas vou dizê-lo na mesma pois foi para isso que se fez o 25 de Abril e hoje, tal como a criança na música da gaivota, “Como ela, somos livres, Somos livres de dizer” –, parece-me que é principalmente a ele, à sua conduta e à dos seus homens que devemos o facto de um golpe de estado (militar, puro e duro) poder-se ter transformado numa revolução popular.

Entretanto, como escrevo em cima do prazo, do joelho e do teclado aberto que já devia estar fechado, que são horas!, posso dar nota de dois acontecimentos em que não se cumpre Abril (nem Maio, nem Junho, nem outro mês qualquer) e são tão estúpidos que doem: a agressão a uma mascote de um clube desportivo – sim, o boneco foi vandalizado e a pessoa lá dentro, o trabalhador, foi agredido; e um jornalista que escreveu e julgou uma pessoa com base nos seus atributos físicos – isto é um eufemismo, que o que homem escreveu foi mesmo muito mau.

Há coisas piores, dir-me-ão, e eu concordo: há coisas, factos, condutas, comportamentos muito piores, incomparavelmente piores, mas estas coisas quase insignificantes (menos para quem as sofre diretamente), que são ridiculamente pequenas na imensidão de problemas que as vidas têm, merecem igualmente a nossa censura e a nossa indignação apesar dessa pequenez ou por isso mesmo, mas principalmente por serem totalmente evitáveis, pois bastava um mínimo de bom senso, de educação, de empatia pelo outro para não acontecerem.

Parafraseando uma educadora de infância que eu conheço: Se não tem nada de bom para dizer, cale-se. Se vai fazer algo de que se pode arrepender, não faça.

Isuvol
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