Muitos a temem quando são jovens, outros a procuram e há quem lhe escape. Sempre ouvi dizer que a morte é das poucas certezas que a vida nos reserva mas ela está presente em todos nós, para uns mais cedo para outros mais tarde. Falar sobre perda ou morte é sempre um assunto delicado e amplo para todas as idades, mas é uma realidade que temos de aceitar.
Há cem anos atrás a morte chegava aos quarenta, agora chega depois dos oitenta. O que mudou? Com o desenvolvimento social, a educação, a redistribuição da riqueza e os avanços da medicina mudaram apenas as causas da morte, mas não a excluíram.
No exercício da minha atividade profissional, – lar de idosos – a velhice e a morte andam comprometidas. As maleitas não perdoam, os fármacos vão suportando as dores até ao limite e inventam-se estratégias para burlar a morte. Muitos têm medo de morrer outros aceitam. Há quem arrume a sua mortalha e quem já tomou providência para doar os seus órgãos.
Neste carrocel de emoções, o importante é adotar algumas medidas de forma a serenar o pavor da morte nos idosos: as suas relações sociais e familiares, que preveem a solidão e o abandono; a sua espiritualidade, onde buscam respostas e conforto à sua finitude, e a psicologia, que os auxilia no seu processo de luto.
Quando há uma separação de um companheiro, seja cônjuge ou amigo, o processo de luto é variável consoante as características de cada pessoa, não só entre os idosos mas também dos seus cuidadores. Todos passamos por diferentes estados emocionais: tristeza, negação, raiva, revolta, confusão, ansiedade. Na minha vida institucional já partiram muitos dos idosos que abracei. Nunca os esquecerei, não os vou deixar morrer na minha memória.
Para mim, o importante é morrer com dignidade e devia ser uma decisão de cada um. Morrer em casa, num espaço privilegiado de afeto é o desejo de muita gente. E o meu? Não me preocupo com a morte mas sei que tenho uma hora de partida. Só espero que o relógio se atrase, porque partir agora seria uma interrupção brusca à minha vida, sem pedir licença. Não estou preparada para uma despedida inesperada, tenho muitos sonhos e promessas ainda por cumprir. Por isso, só quero chegar ao último segundo da minha vida e poder olhar para trás e dizer, com toda a convicção: “Valeu a pena, Raquel.”