Todos sabemos que as cidades têm uma alma própria que as caracteriza e as distingue e que, para além das suas funções habitacionais, se prolonga na nossa memória dos afetos.
Isto vem a propósito de, há dias atrás, termos ocasionalmente deambulado pelas ruas do centro histórico escalabitano. Do que vimos e ouvimos, não gostámos e deixou-nos apreensivos quanto à viabilidade e recuperação da sua malha urbana, sobretudo do tecido comercial. Afinal, uma cidade capital de distrito (infelizmente o mesmo acontece em algumas outras) que, num passado não muito distante, tinha uma invejável pujança e era reconhecida como um dinâmico centro de serviços. Agora, a agonia comercial é confrangedora. Percorremos as suas principais artérias, praticamente sem transeuntes e constatámos que muitos dos estabelecimentos, já tinham fechado portas, com montras forradas a papel, correspondência abandonada, etc.. Nas lojas que teimam em resistir, dificilmente descortinámos no interior algum cliente. Nas conversas que provocámos com os lojistas, a desmotivação era uma constante, e a revolta era mal contida numa lamúria confrangedora: “mataram a cidade e nós fomos os seus bodes expiatórios”. Infelizmente, também, ouvimos esse desabafo em algumas outras cidades da região onde a estagnação económica se vai teimosamente arrastando.
Claro que esta “morte anunciada” só pode espantar, afinal, quem andar distraído. Uma recente política ostensivamente recessiva, onde se baixou drasticamente o rendimento disponível, reduzindo o consumo das famílias, conduziu a uma generalizada recessão, que criou raízes, e que levará algum tempo a recuperar totalmente. O encerramento de pequenas ou micro empresas, avolumou o desemprego local e a migração de uma população ativa, jovem, que constituía a esperança de uma nova vitalidade regional.
Santarém, tal como outras cidades da região, perdeu, não só a “alma”, como também a força anímica do seu tecido empresarial, transformando-se, a pouco e pouco, numa cidade adormecida sem esperança no futuro. A prioridade do pequeno comércio não será eventuais linhas de crédito. Precisam, isso sim, de clientes e de muitos. Para isso, é necessário uma política de urbanismo comercial que, urgentemente, reanime e requalifique as povoações, gerando novas dinâmicas habitacionais e de envolvimento colectivo e sobretudo um acreditar que o futuro é possível e promissor.
- Artigo publicado na edição de agosto do Jornal de Cá.