Entre Duas Cidades: Da inexistência de uma etnia portuguesa

Opinião de Miguel Montez Leal

Ainda actualmente vários historiadores portugueses discutem qual é a data fundacional de Portugal: 1128, 1143, ou 1179. Eu defendo a data de 1128 como o ano zero em que se iniciou o Reino de Portugal, data histórica da batalha de S. Mamede. O que os cidadãos portugueses muitas vezes se esquecem é que os primeiros portucalenses eram uma mistura de galegos, asturianos, leoneses, normandos e borgonheses, e de certa forma, como dizia a poetisa Natália Correia, “Todos somos Hispanos”. Muito antes de existir Portugal, já a Península Ibérica tinha sido conquistada e ocupada por fenícios, gregos, cartagineses, romanos, suevos, visigodos, berberes (e não árabes), judeus (desde pelo menos o século I depois de Cristo)… Se a tudo isto juntarmos os francos, os normandos, os borgonheses, os teutónicos, os genoveses, os florentinos, os ingleses, os flamengos, os dinamarqueses, num País que foi Império desde 1415 até à devolução de Macau em 1999 e à plena independência de Timor em 2001, teremos ainda de acrescentar todos os povos com os quais nos cruzámos desde o início do século XVI: africanos, índios brasileiros, indianos, macaenses, timorenses…

Só quem desconhece a nossa História ou quer branqueá-la, não se apercebe do ridículo, da hipocrisia, da desfaçatez e da mais crassa ignorância em que cai, quando é racista ou xenófobo. E os portugueses são brilhantes em sê-lo passivamente. Convido-vos a fazer a árvore genealógica dos vossos ancestrais. Eu, na minha, já encontrei espanhóis (da Extremadura, Galicia e Vascongadas), italianos de Milão, ingleses, franceses e até um ramo holandês de Hamburgo. Quem descende de lisboetas de muitas gerações é fácil e comum encontrar cidadãos de muitas origens estrangeiras, que vieram viver para a capital do Império e para o porto de mar que era Portugal.

Portugal possui cerca de dez milhões de habitantes (agora já um pouco menos, desde a emigração massiva dos últimos quatro anos). Fora de Portugal vivem cinco milhões de portugueses, ou seja¸ um em cada três portugueses vive longe da sua terra natal. É triste assistirmos à indiferença com que os portugueses assistem à tragédia do Mediterrâneo, entretidos que estão alienadamente com o Jorge Jesus, que não é o Messias, as procissões, a Casa dos Segredos, o Masterchef e a imprensa tablóide e rosa.

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