Eutanásia

Opinião de João Fróis

Não deixa de ser paradoxal que em tempos de pandemia, quando se unem todos os esforços para salvar vidas, o nosso parlamento tenha votado sobre a eutanásia. Palavra de origem grega, em que “eu” significa boa e “tanathos” morte, ou seja uma boa morte.

O ato intencional de um indivíduo decidir o termo da sua vida face a uma doença incurável ou terminal, e pedir ajuda para tal, continua a ser polémico. Tanto que o voluntarismo da pessoa é a linha que separa entre o suicídio assistido e o homicídio. A consciência de quem decide pedir ajuda para morrer é o imperativo ético que levou países como a Holanda, o primeiro em 2001, a Bélgica, Suíça, Alemanha e Canadá, entre outros, a legalizar esta prática. Não haver capacidade para dar o consentimento impede que o termo da vida possa ocorrer, passando a ser considerado homicídio.

Curiosamente é na Grécia clássica, onde Hipócrates, considerado o pai da medicina, no seu famoso juramento, afirma como missão do médico garantir a integridade da vida e a assistência aos doentes, que Sócrates e Platão aceitem como moralmente aceitável a prática da eutanásia. No berço da filosofia moderna a dialética sobre a vida e a morte era já comum e tema recorrente em várias correntes como o Estoicismo que defendia a ética como o foco principal do conhecimento humano.

Atualmente na nossa lei, embora a morte assistida não esteja tipificada, a sua prática pode ser punida como homicídio privilegiado, artº 133 do código Penal, a pedido da vítima, artº 134 e como crime de incitamento ou auxílio ao suicídio, artº 135, com penas respetivas entre um a cinco anos, até três e de dois a oito anos. É para despenalizar quem assiste à morte de outrem, que se debateu e votou na Assembleia da República. Irá agora para apreciação do presidente.

O projeto de lei prevê e garante a objeção de consciência de médicos e enfermeiros, salvaguardando assim a sua consciência ética e a defesa do juramento e da vida dos doentes. São determinadas como condições imperativas para que um doente maior de 18 anos possa pedir a morte assistida, não sofrer de doença ou perturbação mental, estar numa situação de sofrimento insuportável e irreversível e com doença incurável ou fatal. O consentimento tem igualmente de ser dado em vários momentos diferentes, reiterando essa vontade de término da vida.

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Não cabe aqui acrescentar polémica, antes um exercício de reflexão sobre a natureza deste ato e em que medida salvaguarda a vida em geral e permite a liberdade de alguém, em situação de incapacidade de pôr termo à sua vida mas em plena consciência, o poder fazer com ajuda de outro.

Venha a lei a ser aprovada ou não, uma coisa é certa. A dignidade da vida deve ser sempre um bem maior a ser protegido e o equilíbrio entre a ética e a liberdade ditarão sempre os limites da ação humana.

*Artigo publicado na edição de fevereiro do Jornal de Cá.

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