Ana Catarina Vieira é advogada de profissão, formadora por vocação e a política surge na sua vida, por paixão à terra
“Essas questões da idade não me incomodam nada, até tenho muito gosto”, começa por dizer. Nascida no Reguengo, como faz questão de salientar, é frontal, atenta, e mãe de um adolescente de 13 anos, que fez os primeiros anos de escolaridade em Valada, pelo “apego” à terra e na tentativa que a escola não encerrasse portas.
Identifica o principal problema da freguesia sem qualquer hesitação: o PDM e as restrições à construção, que espera possam vir a ser levantadas. Aí, acredita, muitas oportunidades surgirão, e Valada pode retomar o lugar que é seu por direito no concelho do Cartaxo.
Sempre exerceu aqui no Cartaxo?
Abri o meu escritório aqui no dia 3 de janeiro de 1998, e aqui tenho exercido sempre.
E como é que surgiu esta aventura da política na sua vida?
É a primeira vez, embora o meu pai, que era uma pessoa muito ligada à política e que ainda teve alguma intervenção ao nível da freguesia, costumava dizer ‘que desgosto que eu tenho, dois filhos e nenhum quer nada com a política’. Eu nunca tinha estado para aí virada, mas este convite surgiu numa altura em que eu achei ‘sim senhora’. Também já estava com outra maturidade, com outra disponibilidade, e achei que também podia dar algum contributo, fazer alguma coisa mais na minha terra, na minha freguesia. O convite veio do atual presidente da Junta, Manuel Alfredo Fabiano. Estava ainda tudo muito embrionário, mas estavam a começar a surgir os convites e a formação de listas. E pronto, eu aceitei.
Vive no Cartaxo, o filho anda agora na escola no Cartaxo. Mas o que é que a fez mantê-lo na escola em Valada nos primeiros anos?
Era o apego a Valada, era a tentativa de que a escola não fechasse, o considerar que, embora fosse uma escola mais pequena, também havia possibilidade de o professor trabalhar mais individualmente com as crianças.
Todas as semanas vou uma, duas vezes, pelo menos, a Valada e ao Reguengo, para ver como é que as coisas estão, gosto de dar uma voltinha ali na terra, falar com as pessoas… gosto de estar a par. Mantenho sempre essa ligação e é um bocadinho o recarregar baterias, o ir à terra.
É possível recarregar essas baterias quando olha à volta e se depara com a degradação que existe em muitos edifícios da sua freguesia?
Entristece, até porque Valada é uma freguesia, do ponto de vista do património arquitetónico, muito rica, talvez a mais rica do concelho. É lamentável, depois, vermos esse património a degradar-se. Mas tudo isso está relacionado com as dificuldades de construção. E não é só o construir de raiz, é o reconstruir ou recuperar e mesmo afetar edifícios a outro fim que não aquele ao qual se destinavam.
E até agora, está feliz com o trabalho que tem sido possível fazer?
Queremos sempre mais, mas temos, essencialmente, esse problema da construção, que tem de ser eliminado com o PDM (Plano Diretor Municipal). Estamos a tentar levantar os condicionalismos do INAG (Instituto Nacional da Água) na revisão do PDM. Há imensos anos que a freguesia não é inundada. Nos últimos anos, quanto muito, ficamos isolados. O que também é uma tristeza, porque somos uma freguesia com muitos acessos, só que, em termos de infraestruturas, também não estão adaptadas.
O que é que definiria como prioritário na sua freguesia?
Para já, acho que, com a alteração do PDM, muita coisa acabaria por vir por acréscimo, do ponto de vista político e do ponto de vista profissional. Se as restrições do PDM deixarem de existir ao nível que existem, acredito verdadeiramente que, a partir daí, muitas oportunidades virão para que a freguesia possa vir a ter um papel predominante como já teve.
Como é que foi o seu percurso escolar?
Fiz a faculdade em Setúbal, depois vim estagiar para cá. Fiz a parte teórica do estágio em Lisboa, em 96, que estávamos isolados, ainda tive de fazer o percurso para Lisboa para fazer as aulas teóricas na Ordem dos Advogados de automotora. Passei algumas vezes de barco a remos para a estação do Reguengo e, a maioria das vezes, vinha até Porto de Muge e ainda havia a automotora para o Setil. Depois, tinha de ficar todo o dia em Lisboa. Eu tinha aulas só de manhã, mas acabava por ter de ficar lá todo o dia, porque depois, só tinha forma de regressar do Setil para Porto de Muge as sete da tarde, ou coisa que o valha.
Fiz aqui o estágio, a parte prática.
É advogada, formadora, é presidente da mesa da Assembleia de Freguesia de Valada. Consegue conjugar todas essas atividades com a vida familiar?
Consegue-se. Defeito ou feitio, eu sou uma pessoa que dorme pouco. Depois, também tenho, a nível familiar, a minha mãe, que também é um bom suporte. Desde que nós estejamos empenhados, arranja-se sempre tempo para tudo. Eu tento conjugar tudo e aproveitar ao máximo os momentos que estou com o meu filho.
É uma mulher realizada?
Sou. Em termos profissionais, faço aquilo que gosto, em termos familiares, apesar de ser divorciada, vivo muito bem com isso, tenho um filho maravilhoso, uns familiares maravilhosos. Lamento a perda de alguns que já partiram. E tenho amigos maravilhosos, também, nomeadamente o grupo mais restrito de amizades, que são pessoas impecáveis e, portanto, sinto-me, sem dúvida alguma, uma mulher realizada.
Imaginar-se-ia a viver noutro sítio?
Do mundo, não direi, porque eu gosto muito do nosso Portugal. Noutro sítio do nosso país… talvez. Mas voltando sempre. O nosso país é um pedaço pequenino mas muito bonito e, portanto, talvez me visse a viver noutro ou noutros pontos do país, mas regressando sempre à minha base.
Entrevista publicada na Revista DADA nº59, edição impressa de dezembro de 2015. Na altura, Ana Catarina Vieira era presidente da Mesa da Assembleia de Freguesia de Valada. Foto em destaque ©Vitor Neno.