Maior abertura à concessão de crédito à habitação, spreads baixos e alguma retoma da economia estão a agitar o mercado imobiliário.
O Instituto Nacional de Estatística divulgou, no passado mês de junho, os dados relativos às vendas de imobiliário em Portugal. Uma surpresa em tempos de crise e fraco desempenho da maior parte dos setores económicos. No primeiro trimestre de 2015 foram vendidas, em Portugal, 25.716 casas, números que representam um aumento de 38 por cento em relação ao período homólogo de 2014. Não se via nada assim desde final de 2010, ano em que o último trimestre fechou com 30 mil casas vendidas.
Estes números a nível nacional estão em linha com a sensibilidade da maioria dos agentes imobiliários com sede no Cartaxo, com quem fizemos uma ronda sobre a situação do mercado imobiliário no concelho. Para contas futuras, tome-se nota que no Cartaxo existem cerca de 10 mil edifícios. Embora não seja possível apurar quantos imóveis estão para venda ou aluguer, três das principais agências imobiliárias, a Remax, a Medicarta e a Imoescala, disponibilizam, no Portalimo, portal dedicado ao imobiliário a nível nacional, cerca de 700 opções, entre apartamentos, moradias, quintas, lojas, terrenos ou garagens no concelho do Cartaxo. Mas há mais e as vendas não param. Pelo menos é que nos diz André Henriques, da Remax, “Não me posso queixar. As coisas têm-me corrido bem. No primeiro semestre de 2015 já tenho mais faturação que no ano passado. A minha média, neste momento, é de duas casas vendidas por mês”. Esta melhoria que se nota no mercado é confirmada por Dina Silva, da Medicarta que, embora lembre que “até fevereiro deste ano, as coisas andaram ainda um bocado por baixo”, salienta haver “um crescimento pequeno, mas que já dá para se notar. Sente-se que neste momento o mercado está a mexer sobretudo porque a abertura dos bancos está a ser diferente”. Quem também não se queixa é Luísa da Guia, da Remax, que adianta uma explicação: “a crise é real, mas há a crise e há aqueles que aproveitam a crise para crescer. Em boa verdade, o meu melhor ano de vendas foi 2013. Não havia crédito bancário mas havia pessoas com dinheiro, que o tiraram dos bancos e compraram imobiliário”. É com alguma ironia que Luísa da Guia deixa correr as ideias. “Os pobres não sentiram a crise. Já estavam habituados a ser remediados. Quem não tinha dinheiro não perdeu nada. Já não tinha. A classe média é que praticamente desapareceu. Ou deu o salto ou ficou pobre. Agora, os ricos continuaram a ser ricos” diz-nos, acrescentando que “nos últimos três anos, com a chegada da troika e com todas as restrições que vivemos, estivemos a trabalhar 90 por cento com capitais próprios. Neste momento, com a abertura que a banca está a começar a ter, já trabalhamos a par com o crédito e o investimento, daí o aumento da procura”.
No meio das nossas visitas às imobiliárias, falámos também com compradores. Percebemos que, neste momento, alguma coisa está a mudar quando ouvimos a história de Paulo e Maria. Ao fim de quase quatro anos de namoro, este jovem casal, ela com 27, ele com 29 anos, ambos empregados, com um rendimento mensal de cerca de 1800 euros, resolveram que era chegado o momento de dar o grande passo: casar. É aqui que o exemplo da irmã de Maria veio ensombrar a vontade de comprar casa. Há cinco anos, a irmã mais velha da nossa entrevistada viu a casa onde morava ser penhorada, por ter ficado impossibilitada de a pagar ao banco, depois do marido ter ficado desempregado. Com receio de lhes poder vir a acontecer o mesmo no futuro, o casal decidiu que a melhor opção seria o aluguer. Em maio deste ano começaram o processo de procura de uma casa para alugar e foi então que perceberam que, se fizessem uma escolha criteriosa, negociando muito bem valores e condições, talvez fosse possível comprarem casa e ficar com uma prestação mensal muito semelhante ao que pagariam por um arrendamento.
João Soares, da Caixa de Crédito Agrícola do Cartaxo, confirma que na atual conjuntura “a banca está mais recetiva ao crédito à habitação, que continua a ser a modalidade de crédito com mais crédito vencido e a que mais vincula e fideliza os clientes”. A explicação parece simples. “Há um ano ainda estávamos no epicentro da crise. Com a queda do rating, o custo do dinheiro aumentou e isto aliado ao facto de o setor imobiliário ter muito crédito vencido, fez com que os spreads disparassem”, diz. “Atualmente, o custo do dinheiro é menor e repercute-se em spreads mais baixos e, logo, em mais procura. Neste momento temos spreads entre 1,75 por cento e 3,5 por cento, quando há um ano este topo era o valor mais baixo, havendo bancos que praticavam spreads superiores a 6 por cento” explica o gestor bancário, que refere o facto de, neste momento, “a banca estar capitalizada e tem liquidez, o que, num passado recente, não acontecia”.
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Ficamos então a saber que é preciso saber escolher. Acertar um compromisso entre o que se pretende ou necessita e o melhor preço que se possa encontrar, não só para o imóvel como para o dinheiro para o pagar. Afinal, que tipo de imóvel tem mais procura? Também quanto a esta questão os profissionais estão de acordo. André Martins fala da sua experiência pessoal. “Hoje em dia, o cliente procura mais o valor que a tipologia. Se puder ser um T3 pelo valor de um T2, melhor. A grande preocupação é saber quanto é que se fica a pagar mensalmente. Quando comecei a trabalhar neste ramo, essa preocupação não existia. O cliente escolhia e, se no empréstimo pudesse incluir mais algum dinheiro para comprar um carro, melhor ainda. Hoje isso não acontece. Também pela atenção que os bancos estão a dar a estes negócios. Os bancos cometeram os erros que se viram e que espero não se voltem a repetir. Eu ouço muita gente dizer que está assim por causa das imobiliárias, mas acho isso um perfeito disparate. Nós só prestamos um serviço. O nosso lema é encontrar a melhor solução para os nossos clientes. Para o cliente comprador ou vendedor”. Dina Silva confirma que o que se vende mais nesta altura são apartamentos, “mas também moradias e, por estranho que pareça, nos últimos dois meses temos vendido terrenos para construção e terrenos para agricultura”, revela. E deixa uma nota curiosa, quando confidencia que “com a expetativa de o estacionamento subterrâneo e à superfície passar a ser pago, começou a haver procura de garagens”. Paulo Cabral, da Remax, define os imóveis que mais comercializam neste momento, balizando os valores. “As casas mais vendidas têm valores entre os 40 mil e os 80 mil euros. No caso das moradias os números sobem para os 150 mil”, refere. Estes valores são confirmados por dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), que indicam que em janeiro de 2015 o valor médio dos novos créditos à habitação era de 78.801 euros, e que têm vindo em subida constante desde dezembro de 2013, mês em que os novos créditos se cifravam em 64.827 euros. Como curiosidade, refiram-se os picos atingidos em abril de 2010, 89.666 euros, e em novembro de 2012, com 82.196 euros.
Estes números poderão querer indicar que os preços dos bens imóveis estão a baixar. Luísa da Guia confirma que sim. “O preço do metro quadrado de, por exemplo, uma moradia citadina, ronda atualmente os 600 euros. No ano 2000 podia estar nos 850 euros. Nos últimos sete anos tivemos períodos em que o valor dos imóveis baixava um por cento ao mês”, lembra. André Henriques confirma estes valores, mas defende que “aqui no concelho os preços, neste momento, se calhar, não estão desvalorizados. Antes é que estavam sobrevalorizados. Havia preços superiores a zonas como Alverca ou Arruda, mais próximas de Lisboa”.
Uma das novidades que o mercado apresenta, são os imóveis da banca, que apesar de representarem apenas dois por cento das vendas de imobiliário a nível nacional, surgem sempre no meio de qualquer conversa sobre este assunto. Dina Silva não se esquece de os referir, porque “com os spreads baixíssimos que os bancos praticam, há possibilidade de ficar com um pagamento inferior a uma renda”, faz notar. Também para André Henriques “os bons negócios dos imóveis da banca são as boas condições que oferecem. Os clientes não têm de pagar a avaliação, além de outras vantagens que a banca proporciona, mas com preços, muitas vezes, acima dos preços de mercado”. Voltamos a João Soares, que explica que “uma das formas que os bancos têm de recuperar créditos é ficar com o bem, neste caso, a casa. Mas um imóvel é um bem oneroso para o banco e portanto, é preciso vendê-lo, porque é um ativo que começa a dar despesa. Os ‘spreads’ mínimos beneficiam, de facto, mas os bancos não oferecem melhores condições a estes clientes. Oferecem as melhores que têm”, diz-nos o gestor, enquanto reconhece que a banca “há muitos anos, na corrida pela captação de crédito à habitação fez, sobreavaliações. O que acontece é que, quando os bancos ficam com um imóvel, ficam com ele com um valor acima do valor de mercado, porque o erro já vem da origem”.
Resta saber se investir em imobiliário ainda é um bom negócio. Luísa da Guia não tem dúvidas, “ainda é um bom investimento”, diz, “mas o nosso conselho, para alguém que tenha, por exemplo, 100 mil euros para investir e quiser rentabilizar esse investimento, em lugar de comprar um imóvel de 100 mil euros, é melhor comprar dois de 50 mil”. André Henriques alerta para o facto de estarmos “a passar por um período bom para comprar, nem tanto para vender. As casas estão a desvalorizar e essa tendência vai manter-se. Mas vai haver um momento em que o mercado vai ter de estabilizar. Tem de ser. As casas não podem ser oferecidas. Portanto, há limites para a queda”. Para André Henriques, “o Cartaxo é um concelho que ainda tem algum dinamismo, apesar de querermos sempre mais. Ainda existe procura. Existe vontade de querer ficar cá e ainda há pessoas de fora que querem vir para cá. Há alguns meses vendi uma quintinha em Vale da Pinta a um casal, que vivia na zona de Abrantes e, como trabalhavam em Santarém, decidiram vir para cá. O Cartaxo continua a ser uma terra de oportunidades para quem quiser investir no setor imobiliário”.
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