Opinião de Afonso Morango
Numa altura em que a luta da ditadura contra a democracia volta a assolar o continente europeu, ficamos com a impressão que os líderes ocidentais não compreendem verdadeiramente com quem estão a lidar. Tal e qual como aconteceu em 1939.
Ao longo dos últimos dias, temos assistido ao acordar e implementar de várias sanções por parte dos Estados Unidos, Canadá, União Europeia e, mais recentemente, Japão. Mas as democracias do Ocidente não podem ficar por aqui. Devemos substituir o petróleo e o gás russos, pressionar a OPEP, aumentar a produção, reabrir o oleoduto Keystone. Não se pode salvar o planeta se não se salvarem as pessoas que nele vivem. Temos, contudo, que reconhecer que haverá custos e sacrifícios. Esperámos muito tempo, o preço é elevado, mas só vai aumentar. Chegou a hora de lutar. É necessário apoiar a Ucrânia militarmente e de imediato com tudo à exceção de tropas da NATO no terreno, já que o Artigo Quinto do Tratado de Washington assim não o permite. Levar à bancarrota a máquina de guerra de Putin. Congelar e confiscar as finanças da Rússia, de Putin e os biliões dos oligarcas que tem por trás.
Foi bom assistir à união dos países da EU manifestada no acordo de novas sanções, desta vez verdadeiramente robustas. Com certeza o Kremlin não esperava esta união em Bruxelas.
Devemos expulsar a Rússia de todas as instituições financeiras e de inteligência. Não vale a pena falar. A nova mensagem unificada deverá ser “parar ou ficar completamente isolado”.Devemos proibir todos os elementos da máquina de propaganda global de Putin. Desligá-los, fechá-los, mandá-los para casa. Parar de ajudar o ditador a espalhar mentiras e ódio.
Não se trata de uma guerra pequena. A ordem europeia e mundial estão a ser completamente alteradas. Até a Alemanha acabou de mudar grande parte da sua política de defesa. Desde 1945, nunca enviaram armamento para zonas de conflito, por razões óbvias. Ontem isso foi revertido e Olaf Scholz disse que “estamos numa nova era”.
A solução está longe de ser simples, mas não podemos limitar-nos a condenações. Neville Chamberlain também condenou Hitler após a invasão da Polónia. Na política, nada acontece por acaso e o ponto da História em que nos encontramos está cheio de promessas e perigos. O mundo ou avançará para a unidade e a prosperidade amplamente partilhada, ou se afastará. Não é suficiente apenas querer – temos de nos perguntar o que vamos fazer para acertar as coisas.
Toda a guerra é um sintoma do fracasso do Homem como animal pensante e não há bandeira suficientemente grande para cobrir a vergonha de matar pessoas inocentes. Habituámo-nos à ideia de que os perigos estavam longe e nunca nos iriam afetar, mas a guerra regressou à Europa. O destino do mundo é decidido na Ucrânia e esta falta de resposta internacional irá criar um precedente perigoso para as décadas vindouras.
O mundo perdeu o seu rumo e, oitenta anos mais tarde, as palavras de Charlie Chaplin permanecem mais relevantes do que nunca. Acordámos em 1939 e uma nova “Cortina de Ferro” ergue-se na Europa. Uma vez mais, um país europeu está a ser invadido e destruído pelo devaneio de um ditador.
Mark Twain disse que a História não se repete, mas rima frequentemente. Neste momento, estamos a escrever o nosso futuro enquanto humanidade, uma vez mais. A primeira quadra do século XXI é estarrecedora e o resto do poema adivinha-se tenebroso.
*Artigo publicado na edição de março do Jornal de Cá.