O despertar de Portugal
"Muito há por fazer e estar mais e melhor informado e não se deixar influenciar por ideias atraentes, mas dificilmente realizáveis, de um lado, e por preconceitos ideológicos assentes no medo, no outro, é mais que relevante, essencial." Por João Fróis
A poucas semanas de Portugal comemorar os 50 anos do 25 de Abril, há uma realidade indesmentível na sociedade lusitana, a consciencialização da força coletiva.
Portugal continua na sua essência uma sociedade conservadora. Os velhos estigmas do estado novo ainda subsistem na resistência à mudança e na aparente aceitação do que se nos impõe e na crença que a realidade dificilmente poderá mudar. Ora é precisamente aqui que verdadeiramente estão a acontecer alterações significativas, a exemplo do que há muito vemos nos países centrais da velha europa, com movimentos sociais, fora da lógica dos sindicatos, demasiado politizados, a fazerem valer os seus direitos e a exibirem sem receios a defesa dos mesmos em ações concertadas e manifestações pacificas. Mas por detrás existe um mundo digitalizado que se move a uma velocidade vertiginosa e ainda dificilmente compreensível na sua amplitude e abrangência social.
Por estes dias vivemos tempos de campanha eleitoral, com muita atenção mediática própria de uma mudança de ciclo político, e as ações de protesto surgem coladas à maior visibilidade que esta exposição traduz. Mas independentemente do momento, percebe-se que as novas gerações, muito á boleia dos exemplos externos e dos movimentos de ação climática, mostram uma disponibilidade para a reivindicação que antes era quase exclusiva dos sindicatos. Temos agora a sociedade civil mais desperta e ativa e predisposta a lutar pelas suas causas e que em boa verdade são muitas e diversas. Sejam mais globais, como a luta contra o aquecimento do planeta, sejam nacionais, na luta pelo direito à habitação e emprego, ou de direitos de cidadania com as questões de género e igualdade para todos à cabeça.
O veículo para esta profusão de ações encontra-se nas mãos de todos nós. O smartphone tornou-se no grande acelerador e até transformador da comunicação, envolvendo tantas oportunidades como perigos. Reduziu a informação a slogans e chavões fortes, a ideias lançadas no éter como bombas, de modo a estilhaçarem tabus ou a semearem o caos. A diferença entre uma boa informação, real e verdadeira e uma fake news, é a perceção de cada um e com o crivo apertado das suas crenças. Basta atentar nos fenómenos globais de Jaír Bolsonaro e Donald Trump, dois políticos que disseminaram as suas ideias polémicas através das redes sociais, o whatsapp no Brasil e o Twitter, agora X, nos EUA.
A captação da atenção com frases impactantes é a nova adição digital, criando uma legião de crentes em parangonas e conceitos que tantas vezes são falsos, distorcendo a verdade factual, e que por repetição e massificação se vão tornando as novas missivas. No fundo, as pessoas acreditam no que lhes convém e em que lhes dá, de forma fácil e açucarada, uma realidade verosímil mesmo que utópica.
Por outro lado, esta aceleração da informação permitiu algo impensável há duas décadas, todos terem acesso a quase tudo ao mesmo tempo, na sua mão. Este fenómeno, ainda pouco estudado, sobre toda a complexidade de efeitos que esta ultra exposição mediática induz no individuo, leva a que aparentemente qualquer pessoa saiba o que se passa no mundo e sinta que possui o conhecimento suficiente sobre uma generalidade de assuntos. Ora é nesta aparência que reside a viciação do pensamento e a redução do exercício crítico, abrindo espaço à entrada das ideologias que são lançadas a cada segundo nas janelas digitais e tentam seduzir e formatar opiniões. No fundo o risco de estarmos a ser amestrados é real e muito preocupante. E poucos têm verdadeira consciência dos imensos perigos desta vaga perniciosa e com objetivos obscuros e pouco abonatórios para o bem global.
Voltando ao nosso país, há que tentar compreender o que são protestos importados e o que são reivindicações locais e muito ligadas aos muitos problemas que o país atravessa e que urgem ser resolvidos. Cabe aqui discernir de quem aproveita a mediatização para fomentar o medo da mudança, alimentando os tais estigmas enraizados sobretudo nas gerações mais velhas, dos que verdadeiramente têm um desígnio transformador para o país e que permita o desenvolvimento da economia, a criação de oportunidades e fixação dos jovens e o aumento do poder de compra e da qualidade de vida em geral. Muito há por fazer e estar mais e melhor informado e não se deixar influenciar por ideias atraentes, mas dificilmente realizáveis, de um lado, e por preconceitos ideológicos assentes no medo, no outro, é mais que relevante, essencial.
Sabemos que o equilíbrio social é construído na difícil dialética entre segurança e liberdade e que uma cede sempre face à outra. Mas existem alguns perigos. Mais segurança e controlo traduzem menos liberdade, seja individual ou coletiva, mas conforta face ao medo do desconhecido. Mais liberdade permite novas ideias e fluxos, sejam humanos ou económicos, mas com riscos de perda de controlo sobre os mesmos. Como em quase tudo na vida o segredo está no equilíbrio entre as duas realidades, para a defesa do bem coletivo e da paz social. Saibamos sempre tomar as melhores decisões em consciência e de forma livre. O país agradece. O futuro de todos nós também.