A imagem de duas jovens a atirarem sopa de tomate contra um quadro de Vincent Van Gogh tornou-se rapidamente viral neste mundo híper mediatizado. As duas jovens de 20 e 21 anos, fazem parte de um movimento ativista denominado “Just stop oil” e que pede a cessação imediata de novos projetos de exploração de petróleo ou gás e tem vindo a escolher ambientes culturais para chamar atenção para a sua causa de defesa do planeta. A recente decisão do governo britânico de explorar novas jazidas no mar do Norte despoletou esta vaga ativista e que ameaça intensificar-se nos próximos meses.
Esta imagem forte, captada na National Gallery de Londres, onde o famoso quadro de 1888, “os girassóis” está exposto, pode bem ser a alegoria ao estado do mundo. A pintura bela, valiosa e irrepetível tal como o planeta e a sopa de tomate como as agressões infligidas pela ação humana. Pelo meio existe um vidro que impediu que a tela ficasse danificada e também esse pode significar a estreita margem de manobra que ainda nos separa do colapso.
Não por acaso são jovens que se juntam em protestos pelo mundo. Muitos já nascidos neste século conturbado e que cresceram com a evidência do caos climático e vislumbram as enormes preocupações sobre o seu futuro imediato, com o limite na sobrevivência da espécie humana. Após uma pandemia que paralisou o mundo, veio uma guerra na Ucrânia e uma crise energética que está a abalar a economia mundial e ameaça a sobrevivência de milhões às mãos do general inverno, normalmente aplacado pelo aquecimento a gás das casas cobertas de neve e gelo no centro e norte da velha Europa.
Num mundo em ebulição, os protestos que varrem o Irão mostram outra face da doença civilizacional que muitos regimes políticos alimentam. A prisão da jovem curda Mahsa Amini a 13 de setembro, pela polícia da moralidade do aiatola Ali Khamenei, pela simples razão de esta não estar a usar o Hijab, o véu islâmico que cobre o cabelo feminino, já seria contestada mas a morte da jovem na prisão gerou uma vaga de protestos violentos por toda a antiga Pérsia, a pedir a demissão do tirano e o fim da repressão policial. Os ventos da liberdade varrem um mundo amarrado a ditaduras políticas e económicas.
Também aqui a fotografia de Amina pode ser uma alegoria. A liberdade ameaçada, coagida e violentada às mãos da tirania, da força e da repressão.
Mas o mundo insiste em nos dar quadros tristes e decadentes. Mais que a destruição das inundações que assolam a Oceânia e Filipinas, assistir às declarações de Xi Jinping a ameaçar pela força a recuperação de Taiwan mostra que quando pensamos que já atingimos o caos, tudo pode ainda piorar. Pelo meio o inenarrável regime da Coreia do Norte dispara mísseis sobre o Japão, mostrando força quando o povo morre de fome.
A pergunta que nos assombra é saber se a tão propalada 3ª guerra mundial não é mesmo o que estamos a viver? Múltiplos focos de guerra e tensão, ameaças generalizadas com a saúde do planeta à cabeça mas com a energia a reboque, a inflação galopante e o custo de vida a tornar-se insustentável. O famoso efeito borboleta a acontecer com uma dimensão nunca antes vista. E o pior é mesmo a sensação terrível de que ninguém consegue parar esta imensa bola de neve que vai destruindo tudo à sua passagem e que estamos no limiar do inferno civilizacional, o salve-se quem puder.
Já no século XVIII o escritor francês Jaques Henry de Saint-Pierre afirmava “o Homem é o único ser sensível que se destrói a si próprio no estado de absoluta liberdade; qualquer outro animal, quando se despedaça, é para destruir prisões e quebrar cadeias”.