O que a comunicação social não nos conta

Opinião de Ricardo Magalhães

Fontes fiáveis e íntegras ou entidades manipuladoras e sem escrúpulos? As discussões sobre o tema que hoje trago redundam facilmente neste tipo de análises. A verdade, essa, tenderá sempre a ficar-se pelo meio. Mas afinal, quais são os interesses de quem produz o conteúdo que lemos, ouvimos e assistimos diariamente na internet, jornais ou televisão?

Obviamente para qualquer atividade existem primeiro que tudo os limites legais. Esses são importantíssimos, mas quase sempre insuficientes. São por isso necessários também os limites morais. Estes últimos são muito mais voláteis, pelo que muitas profissões desenvolveram um código deontológico que pudesse alinhar todos os profissionais dessas áreas pelos mesmos deveres éticos. Existem algumas punições legais previstas para quebras do código deontológico, mas ainda assim sobra espaço para que cada um possa agir de acordo com um código moral mais ou menos rigoroso.

Deontologicamente, seria de esperar que qualquer meio de comunicação social fosse isento e factual nos seus serviços de informação. No entanto, esse raramente é o caso. Talvez por uma de 3 razões. A primeira é que é muito difícil não passar uma mensagem com aquilo que escrevemos; requer esforço pelo menos. Um exemplo ilustrativo da pandemia, com a mesma informação, mas com uma mensagem completamente diferente: “1,2% dos mortos por Covid-19 na Itália desde Fevereiro de 2021 tinham a vacinação completa” ou “98,8% dos mortos por Covid-19 na Itália desde Fevereiro de 2021 não tinham a vacinação completa”. As palavras escolhidas ou a forma como se dizem as coisas tem um impacto profundo na mensagem transmitida, por vezes bem maior que o conteúdo.

Em segundo lugar, há um pouco uma tendência atual de embelezar peças jornalísticas com pequenos comentários, que procuram captar mais atenção, reações e partilhas, mas que acabam por afastar a peça da sua orientação factual e de neutralidade. Tornam-se por isso notícias opinativas e com julgamentos, toldando decisivamente a opinião de quem as lê ou ouve.

Finalmente, existe a motivação económica. A comunicação social, como qualquer negócio, não vive do ar. Precisa de investidores e de quem compre os seus espaços de publicidade. E no mercado extremamente competitivo e de margens curtas em que vivem, muitos meios de comunicação social acabam por dar uns “bónus” a quem neles investe. Esses bónus consistem normalmente numa maior exposição mediática e de conteúdo tendencialmente mais favorável.

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Nos Estados Unidos, isto que acabei de descrever não é tabu e são os próprios meios de comunicação que se identificam como tendo uma linha editorial com uma determinada tendência. Cá em Portugal não vemos as coisas dessa forma, sendo notório que há órgãos que seguem também uma tendência sem, no entanto, a exporem de forma clara.

Nada é perfeito e apontei aqui alguns defeitos. Contudo, continuo a acreditar no papel de informação importantíssimo e meritório da comunicação social na sociedade, pois há também muitos aspetos positivos que não tive aqui espaço para abordar. Saibamos colher os frutos desse trabalho, sempre de forma crítica e atenta ao mundo ao nosso redor.

*Artigo publicado na edição de setembro do Jornal de Cá.

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