Vivemos hoje, na Europa, actos terroristas. Alguns da autoria de radicais islâmicos (Daesch) outros de uma só pessoa, cujas razões são menos claras.
O objectivo é intimidar os governos, gritar vingança pelo que se vive nos países do Médio Oriente e, sobretudo, criar MEDO, sentimentos de defesa, de fecho e de protecção contra quaisquer “outros”. É tão perigoso o mal como este “remédio”.
Há dias, Edgar Morin, (antropólogo, sociólogo, filósofo francês) do cimo dos seus 95 anos, a propósito de um livro que acabou de publicar, dizia mais ou menos isto: o terrorismo existe enquanto se pensa que é um meio eficaz para atingir objectivos. Tivemos, ao longo da história recente, actos terroristas na Europa (lembrou, por exemplo, o grupo alemão Baader-Meinhof que procurava destruir a imprensa capitalista e poderíamos referir o ELP, entre nós, depois de 1974) e todos foram ultrapassados quando se provou a sua ineficácia. Ou seja, “não entremos no jogo que nos querem impor”.
À pergunta, fatal, sobre a guerra de religiões, o filósofo respondeu que, noutros séculos passados, aconteceu com o cristianismo o que agora se vive com a religião islâmica: as Cruzadas, a Inquisição, as lutas entre católicos e protestantes. Aliás, há poucos dias, num ofício fúnebre ouvi um jovem padre referir-se a “católicos”– nós – e “pagãos” – todos os outros.
Morin lembrou ainda que os “mouros”, como aqui são designados, tiveram regiões prósperas, como aconteceu na Andaluzia e que não podemos contrapor religiões mas sim grupos dentro de uma religião, como acontece com os radicais que hoje criaram um “Califado” e querem impor a “Charia” (leitura fundamentalista do Corão).
Mais referiu que, na maior parte dos casos, os terroristas que operam na Europa são cá nascidos e criados. Seria bom reflectir sobre a exclusão, a ausência de ideais numa sociedade em que apenas se fala de “crescimento” e de PIB e em que o desemprego juvenil é brutal. A ausência de ideiais, sublinho. Lembrou que seria urgente prevenir a exclusão na Escola, instituição democrática por excelência e que tão longe anda dessa democracia.
Outros autores e jornalistas chamam a atenção para o facto de que a política e os media e, em particular a televisão, funcionam como amplificadores destes acontecimentos e dão-lhes imenso poder.
A Grã-Bretanha reagiu bem: Não ao Medo, disseram. Mas vemos que basta um incidente insólito e às vezes uma mera ameaça para que todos os canais de TV abram os seus noticiários e repitam, até à exaustão, que o perigo à nossa porta.
E a questão é mesmo essa.
Não é possível viver num mundo de desigualdades, de desprestígios da política pela voz de políticos – veja-se o recente caso do presidente do Eurogrupo com a sua afirmação sobre os “resgates” dos países do Sul que gastariam, segundo ele, o dinheiro em vinho e em mulheres – um mundo de guerras regionais e destruidoras (mais de 300.000 mortos na Síria) em que países do Norte têm responsabilidades, um mundo em que milhões morrem de fome e pensar que na Europa estaríamos protegidos de todos os males.
Estes infelizes acontecimentos deveriam criar uma consciência mais clara da importância da solidariedade, da ligação entre continentes, países e pessoas, um “sobressalto” da democracia participativa. Não parece ser isso que acontece. Tal como do outro lado do Atlântico, com o Sr. Trump, ignorante e aterrador, também aqui se limitam as liberdades, se escorraçam os “estrangeiros”, se assustam as pessoas com a frase “podia ter sido eu”. Pois é. Estamos no mundo, tal como ele é, com contradições e com esperanças e todos somos responsáveis por construirmos sociedades mais justas e melhores. Para pior já basta assim.
Crónica publicada na edição de abril do Jornal de Cá.