Os Excursionistas (I)

Crónica de José Caria Luís

Não. Nunca se compare excursões do antes com o depois. Digam o que disserem, argumentem e inventem o que bem entenderem, mas excursões como aquelas que ocorreram nos anos 50 e 60, nunca mais voltam. Na forma e no conteúdo. Fossem as ditas organizadas pelo Manel Xô-Diabo, pelo Zé da Azóia, Carolina Agostinho ou pelo Etelvino, cada uma teve os seus próprios e rocambolescos episódios. Alguns deles, de tão hilariantes, que se dizia que: melhor que a excursão era a diversão. Não importava se o itinerário nos levava a Fátima, ou ao Parque Mayer, se o propósito era religioso, profano ou um misto de ambos, o que se sabia é que excursão sem vinho e sem alguma bagunçada, não era excursão nem era nada.

Para começar, as comezainas começavam a ser cozinhadas na véspera. Frango corado, pastéis de bacalhau e arroz-doce tinham a preferência do pessoal. Essa coisa do comer fora era um hábito que, até então e por razões óbvias, não estava entranhado nos hábitos do ribatejano. Era caro e não havia! Por isso, fosse manjado dentro da camioneta, no colo ou no regaço, ou na mata quando o sol raiava, não deixava de ser considerado que se comia fora… Quanto à partida, quer o destino fosse perto ou distante, à hora marcada acrescia sempre mais uma horita, por força do mau hábito ribatejano.

Certa vez, numa excursão com partida de Vale da Pinta, visita a Fátima, Nazaré, Sintra e Lisboa, além da habitual confusão na reunião do pessoal em cada partida, aconteceu algo que deixou o grupo tripartido. Já na capital, no Largo Martin Moniz, com bilhetes pré-comprados para a 2.ª sessão de uma revista à portuguesa, no Parque Mayer, mais propriamente no Teatro Variedades, o grupo, manifestando grande desunião, começou logo a desatinar. Alguns bacanos que conheciam, mesmo que só de nome, a oferta na Mouraria, já não quiseram sair dali, optando por farejar a zona. Mesmo com as esposas dentro do autocarro, eles não se coibiram de zarpar. Os restantes, gente mais comedida, avançaram para o Metropolitano dos Restauradores e saíram na estação do Parque. Saíram, mas não todos, porque algumas mulheres, mal souberam que o nome da Revista era “Pernas à Vela”, recusaram sair para não ter que ver tal sem-vergonhice e optaram por continuar viagem até ao fim da linha, Entrecampos, arrastando com elas os contrariados maridos. Achando que o preço do bilhete (1$50) era caro, retaliaram andando lá e cá, pelo mesmo dinheiro, até ao fecho da Rede. E, assim, ficou o grupo excursionista dividido em três.

Agora, em pleno Variedades, onde as cadeiras eram por demais sofisticadas, com o assento rebatível colado às costas, houve dois amigos – o Jaime Ferreira e o Artur Caria – que, tomando-o por peça única, se sentaram sobre as costas. Uns rufias alfacinhas, das filas posteriores, a princípio nem se manifestaram, pensando tratar-se de alguns gigantes, daqueles do basket, mas, observando melhor, constataram que se tratava de dois excursionistas de Vale da Pinta, com boné e tudo, que, inocentemente, lhes toldavam as vistas. Pateada e assobios q.b. puseram os nossos conterrâneos em sobressalto, não sabendo como agir, coitados.

*Artigo publicado na edição de outubro do Jornal de Cá.

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