Os Excursionistas (II)

Crónica de José Caria Luís

Se as excursões organizadas a partir do concelho do Cartaxo eram raras, muito mais rarearam a partir dos anos 60. Paradoxalmente, a causa não se deveu à falta de avidez pela descoberta do desconhecido, nem tão-pouco pelo escassear de meios financeiros para viajar – até porque a progressão salarial era uma realidade -, mas tão-somente porque as famílias passaram a ter alguma facilidade no acesso à compra do seu carrito. Excursões? Estive em duas e não gostei. A última foi mesmo a última.

O itinerário previsto era o seguinte: Vale da Pinta, Fátima, S. Pedro de Moel (almoço na mata), Nazaré, Praia das Maçãs, Sintra e regresso a casa. A saída fez-se com uma hora de atraso e fez escala em Rio Maior – onde se perdeu mais uma hora a assistir ao negócio das cebolas por parte do organizador –; depois de termos passado por Fátima, em passo de corrida – onde nem houve tempo para rezar uma ave-maria, – manjou-se o farnel na mata de S. Pedro de Moel e seguimos para a Nazaré, onde não se podia tomar banho devido ao período da digestão. A Praia das Maçãs, observámo-la de dentro do autocarro, do alto das Azenhas do Mar, já que a hora era de lusco-fusco. Quando passámos por Sintra, passámos mesmo por Sintra, com o Palácio a mirar-nos lá do alto. Se dali a Lisboa foi num ápice, daqui até Vale da Pinta foi num ápice e meio.

Todavia, em termos comparativos, ainda houve pior, mas ainda bem que nesta não fui. Foi numa Quinta-Feira de Ascensão, dia de romaria do concelho. O autocarro do Vinagre tinha uma lotação para 50 lugares, mas como a afluência era grande, o motorista solucionou levando a primeira carga. Depois, retornou a transportar a segunda. No regresso, far-se-ia exatamente o mesmo. O itinerário previsto era fácil e curto. Na ida, saída de Vale da Pinta e chegada a Porto de Muge, uns 17 km, sem escala. Na vinda, saída de Porto de Muge e chegada a Vale da Pinta, mais uns 17 km, sem escala. No entanto, a força maior tem muita força e isso obrigou a que uma vinda forçada obrigasse a alterar o percurso.

Eram 3 da tarde. Jogo de futebol anunciado: Porto de Muge – Vale da Pinta. Em princípio, teria a duração de 90 minutos, mas o demo, ainda que em dia santo, não o permitiu, tendo o prélio durado, apenas, 20 minutos. Por causa de um golo, que para os da casa era golo e para os de fora não era golo, e depois de tantos goles de tinto já antes emborcados pela maioria dos espetadores, desatou tudo ao estalo, dentro e fora do campo, e o jogo acabou por ali.

Mas o pior estava para vir! O transporte do pessoal e jogadores para Vale da Pinta que, mercê do esquema adotado pelo motorista, tinha que ser feito por duas vezes, agora, devido aos tumultos, tinha que levar tudo de uma só vez. E foi assim: crianças e mulheres dentro do autocarro e homens no tejadilho. Rapidamente e sem forças, porque elas, devido à barafunda, já tinham sumido. Como a estrada para Santana estava a ser cortada, o motorista, astuto, marchou sobre Valada, talvez para pedir aliança ou asilo. Que se lixasse a escala. Como muito bem dizia o povo: “Gente de Valada em Porto de Muge é sinal de chuva”, mas o contrário também era aplicável.

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Por esta e pelas outras, excursões? Não contem comigo.

*Artigo publicado na edição de novembro do Jornal de Cá.

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