Que me lembre, só esta semana é que aprendi que o nome deste mês, outubro, tem origem na palavra oito em latim, porque este era o oitavo mês do ano antes da Reforma de Pompílio. (Digo que me lembre porque não acredito que nunca me tivesse cruzado com esta informação dramática pois, afinal, a Reforma de Pompílio, o segundo rei de Roma, já tem mais de 2 600 anos.)
Ou seja, os romanos, em seiscentos e tal antes de Cristo, alteraram os meses do ano de dez para doze, mas nem eles, nem ninguém depois deles, se deu ao trabalho de lhes atualizar os nomes: o mês oito passou a mês dez, mas continuou a chamar-se oitavo mês, o que, aliás – não tenhamos contemplações com a preguiça alheia –, também aconteceu com setembro, novembro e dezembro que, como os próprios nomes indicam, eram os anteriores meses sete, nove e dez.
E isto interessa? Não, na verdade não muito, quase nada, mas é um exemplo paradigmático de uma das (muitas) falhas de quem nos governa, há dois mil anos ou hoje.
Provavelmente, há 2 600 anos, Pompílio deve-se ter virado para quem lhe apresentou a proposta do calendário com 12 meses e perguntado: “Oiça lá, pá, isto fica assim?” – depois fez uma careta, abriu as mãos para reforçar a sua desaprovação e continuou: – “Os meses avançam dois meses, o sete passa a nove e os outros assim por diante e continuam a chamar-se pelos números antigos!? Qual é a lógica disto?”
O romano do calendário pôs o seu ar mais enfastiado e deve ter respondido: “Isso é provisório, majestade, agora fica assim, mas qualquer dia faz-se a coisa como deve de ser e dá-se outros nomes aos meses. O importante é fazer-se a reforma. E que fica com o seu nome.”
Pompílio sorriu e encolheu os ombros. “O gajo tem razão, a Reforma fica feita e com o meu nome; o resto que se lixe”, pensou ele em latim.
E pronto, 2 600 anos depois de Pompílio ter encolhido os seus reais ombros, ainda temos meses com nomes que não coincidem, mas está tudo bem porque os nomes ganharam vida e importância própria para lá das suas origens.
“E depois?”, perguntaria o Pompílio se estivesse a ler isto.
Depois, digo eu, depois é que isto é sempre assim, sempre foi e parece que sempre assim será: nós, a arraia miúda, os cidadãos, o povo, pensamos que as coisas são pensadas e feitas como deve ser, que têm princípio, meio e fim e justificação e fundamento, mas a maior parte das vezes são feitas ao calhas, porque sim, porque alguém se lembra e mesmo quando são tecnicamente pensadas, justificadas e corretas, como os romanos que dividiram o ano em doze e os outros que depois acertaram os anos bissextos, assim que estão feitas e os decisores políticos as apresentaram como um grande feito, o Pompílio fê-lo!, a seguir já ninguém quer saber e as coisas ou ganham vida e tração por si próprias ou não é pelos reis, pelos presidentes ou pelos governos que nos safamos. Bem pelo contrário.