Por um ambiente sem fumo e sem beatas

Por Sara Fernandes, aluna do 12º E da Escola Secundária do Cartaxo

– Mãe, as pessoas que fumam não sabem ler, pois não?
– Penso que, pelo menos, a maior parte saberá. Mas porque é que estás a…
– Então se sabem ler porque é que fumam? Na embalagem diz: “Fumar mata”.

Esta criança era eu, há alguns anos atrás. Para mim sempre foi uma incógnita o porquê de 1,3 biliões de pessoas no mundo escolherem poluir a sua mente e corpo, de livre vontade, com algo que sabem trazer patologias graves e que culminam na morte. Infelizmente, tenho chegado à conclusão de que vivemos num mundo onde, especialmente entre os jovens, o que conta é ser aceite, nem que isso lhes possa custar anos de vida. Ser encarado como “fixe” pelos amigos tornou-se mais importante do que ter boa saúde e viver mais tempo. Na verdade, estudos recentes indicam que a maioria dos fumadores inicia o consumo de forma recreativa ou por influência de amigos, sendo-lhes extremamente difícil deixar este hábito posteriormente. Porquê? Vejamos o que a ciência tem a dizer…

O cérebro é composto por uma quantidade estrondosa de células nervosas, os neurónios. Estas células comunicam entre si por meio de elementos químicos, libertando uma espécie de mensageiro chamado neurotransmissor. Cada neurotransmissor é como uma chave que se encaixa numa fechadura chamada recetor e que está localizado na superfície das células nervosas. Quando um neurotransmissor encontra o seu recetor, ele ativa a célula nervosa que contém esse recetor, desencadeando uma resposta.

A molécula de nicotina imita o papel de um neurotransmissor chamado acetilcolina.

A Acetilcolina controla a contração do músculo esquelético, do coração, do sistema digestivo e a nível cerebral os estados de motivação, excitação e atenção. É produzida a partir da colina (nutriente essencial obtido a partir da dieta), que desempenha uma função importante a nível do metabolismo das gorduras, proteção celular, função nervosa e outras reações bioquímicas. Quando a nicotina atinge o cérebro, junta-se aos recetores de acetilcolina e imita-a, ativando áreas do cérebro envolvidas na produção de sensações de prazer e de gratificação. A nicotina aumenta assim os níveis de um outro neurotransmissor, chamado dopamina, nas partes do cérebro que produzem essas sensações.

Quando alguém começa a fumar, sabe que o que está a fazer é perfeitamente dispensável e prejudicial à saúde. Contudo, com o passar do tempo, tende a relativizar. Culpados? A nicotina, e o próprio fumador que se deixou por ela enganar. Para além de conseguir enganar os fumadores ao fazê-los sentir-se em êxtase, a nicotina causa um efeito de adição, tornando desafiante o processo de desintoxicação. De facto, o fumo do cigarro contém mais de 4.000 substâncias químicas e pelo menos 69 delas provocam cancro. Estas substâncias presentes no cigarro também aceleram o processo de envelhecimento. Alguns dos muitos componentes do cigarro são: acetona (um solvente inflamável utilizado como dissolvente de verniz para as unhas); arsénico (um veneno); benzeno (encontrado na cola vulcanizante); formaldeído (a base de muitos fluidos de embalsamamento); chumbo e alcatrão (um material para pavimentar estradas).

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Algumas das doenças mais associadas ao tabaco são: cancro de pulmão, de boca, laringe, esófago, estômago, pâncreas, rins e bexiga; doenças respiratórias obstrutivas como a bronquite crónica e o enfisema pulmonar. O tabaco também diminui as defesas do organismo, tornando-o mais vulnerável a outras doenças. E o que dizer dos cigarros eletrónicos? A oncologista Rayssa Helena de Sena, alerta: “Apesar de ainda não existirem estudos populacionais concretos sobre o cigarro eletrónico, pois é uma nova forma de tabagismo, não há nenhum motivo para acreditar que o cigarro eletrónico não contenha os mesmos malefícios dos já pesquisados. É importante salientar que não existem formas seguras de consumo de tabaco.”

Apesar de todos sabermos que o tabaco, de facto, mata, mais de um bilião de pessoas no mundo fuma, as indústrias continuam a produzi-lo (pois o que interessa é enriquecer, nem que seja à custa da vida de terceiros) e, aqueles que, como eu, não fumam, continuam a ser obrigados a frequentar espaços, até ao ar livre, onde fumadores, sem se preocupar com a saúde, por vezes, até da própria família, libertam para o meio ambiente substâncias extremamente tóxicas.

Será que ser fumador é compatível com uma atitude ambientalista? Não. A pneumologista Sofia Ravara, em entrevista ao Público, revelou que acredita “que na UE há muito mais do que um milhão de pessoas que acham uma aberração continuar a vender tabaco e continuarmos a sofrer. Não só porque é uma tragédia em termos de saúde, economia e bem-estar social, mas também em termos ambientais. É um tipo de agricultura muito agressiva para o ambiente, tal como a comercialização e distribuição, que envolve combustíveis fósseis. O maior resíduo de plástico no ambiente provém das beatas dos cigarros, além de todas as substâncias tóxicas que vão inquinar a água e os solos. Não fumando, todos acabamos por sofrer as consequências de devastação ambiental e para a saúde”.

Com o objetivo de terminar com este problema de vez, está a ser levada a cabo uma campanha liderada pela Nofumadores, uma ONG espanhola sediada em Madrid que reuniu um milhão de assinaturas, só em Espanha, para o movimento que deu origem à lei dos espaços sem fumo. Contactaram-nos em junho para que Portugal se unisse ao movimento e fosse um dos oito países promotores. É preciso reunir um milhão de assinaturas no total da União Europeia, mas também é preciso que pelo menos sete países tenham atingido o limiar mínimo. Para Portugal, são 14.805 assinaturas. O ministro da Saúde italiano disse recentemente que também queria apostar numa geração livre de tabaco.

Sofia argumenta: “Não é só importante a medida legislativa em si, mas este movimento social em que as pessoas começam finalmente a perceber que os produtos de tabaco e a nicotina não são produtos comuns, iguais aos outros, porque provocam morte prematura, doenças e sofrimento totalmente evitável, têm um enorme impacto na economia (os impostos sobre o tabaco não pagam os custos diretos e indiretos do tabagismo) e provocam custos ambientais enormes.”

Porém, sendo o grupo jovem o mais difícil de convencer a abandonar esta prática, “por causa do discurso, também movido pela indústria, da não proibição”, esta é uma das faixas etárias em que se deverá concentrar maior parte da campanha de sensibilização.

Outro objetivo desta campanha é criar uma rede de praias e parques sem tabaco e beatas, e estender a regulamentação de fumar a locais exteriores públicos como esplanadas, terraços, piscinas, instalações de eventos desportivos.

Em vista a aumentar o número de assinaturas para esta petição antitabaco, Sofia revela que vai ser pedido a vários hospitais que façam campanhas e que promovam bancas de recolha de assinaturas. Isto faz sentido nas farmácias, nos hospitais, nos centros de saúde, mas também nos locais de trabalho. Os promotores desta iniciativa também tencionam colaborar com defensores do meio ambiente já que a sustentabilidade ambiental também é um dos objetivos.

Sem dúvida, devemos fazer o máximo que conseguirmos para preservar a nossa saúde, mostrar que damos valor à vida que nos foi concedida (não só à nossa, mas também à dos que nos rodeiam), bem como promover o respeito pelo meio ambiente, pela Terra, a nossa casa. Até estes resultados serem alcançados, espero que a leitura deste artigo o(a) tenha feito meditar neste assunto tão problemático.


Fontes de informação:

Artigo “Sofia Ravara sobre petição antitabaco: “Os jovens são os mais difíceis de convencer” por serem contra proibição”, Jornal Público Online;

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Isuvol
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