A enxertia consiste, em termos simples, no transporte de um pedaço de uma planta para outra planta, de modo que, as duas partes se reúnam, se liguem estruturalmente, a ponto de poderem crescer uma sobre a outra. Na vinicultura, é vulgar este procedimento de multiplicação e seleção de castas.
À planta original a enxertar, chama-se “cavalo”, sobre o qual se procede ao implante do garfo ou escudo. Esta viria a resultar, mais tarde, na nova planta escolhida para a futura videira.
Para a plantação de uma vinha, inicialmente, é necessário proceder à preparação do solo, com a definição do posicionamento da parcela a plantar em função da geometria e exposição solar. Para além disso, é também preciso definir a distância entre as videiras e a dimensão dos vãos. Por fim, faz-se a salvaguarda dos “travessanhos” ou zonas de maneio para facilitar o acesso, ficando a faltar um dos passos mais importantes: escolher as videiras que melhor se adequam às caraterísticas do solo.
Nesta função, entravam no campo os “medidores” que, com sirgas (espécie de fita métrica constituída por corrente metálica), marcavam no solo todas as distâncias longitudinais e transversais da futura plantação, bem como a geometria definida para a futura vinha. Posteriormente, eram colocadas as “balizas”, isto é, os pequenos troços de cana correspondentes à colocação de cada videira.
Para a enxertia, eram contratados os enxertadores, os chamados “cirurgiões” das videiras, que, baseados em técnicas ancestrais passadas de geração em geração, procediam a essa tarefa. Todos esses técnicos, se assim lhes podemos chamar, possuíam uma equipa de apoio da sua inteira confiança, pois qualquer procedimento na fase de aconchego (na função de rechegar, ou chegar terra ao enxerto), que consistia num pequeno monte de terra em volta do bacelo, de forma a criar o berço da nova videira, com o cuidado necessário para não tocar na “cirurgia”, pois, poria em causa não só semanas de trabalho, como também a idoneidade do técnico.
Contam-se histórias de assalariados que, em rotura com os enxertadores, davam, por maldade, um “toque” propositado no bacelo, pondo em causa todo o trabalho de enxertia.
Diretamente ligada à atividade andou sempre a gastronomia, que, consoante as épocas, era adaptada em função das opções disponíveis, sendo criados “menus” simples e rápidos na confeção, de acordo com as possibilidades de cada um.
No antigo Casal D’Doiro (atual Vila Chã de Ourique), eram vulgarmente confecionadas pelos trabalhadores agrícolas, as chamadas TOIRAS.
As toiras resultavam em fatias de pão caseiro (não confundir com torricado) dispostas sobre duas varas, normalmente de oliveira, espetadas no solo, sobre o lume de vides ou cepas, com uma inclinação de aproximadamente 40º, e que eram recorrentemente viradas e substituídas de posição, em função do calor, até se apresentarem torradas. Posteriormente, eram untadas com azeite e alho e, sobre estas, eram colocadas sardinhas assadas ou bacalhau. Receita rápida, consistente e prática, permanecendo durante anos na base gastronómica da nossa região.
Procurando encontrar definição para o nome de “toiras”, apenas poderei valer-me da base oral, transmitida pelos nossos antepassados: toiras vem de toiradas, já que as duas varas espetadas no solo transmitem a ideia de uns chifres. Além de que, num descuido, o calor do lume poderá queimar o pão e, por isso, aproximar o aspeto negro ao de um toiro….vale o que vale.
Certo é que hoje em dia, no antigo Casal d’Oiro, ainda perduram as toiras, na vila ou no campo, em ricos e pobres.
Agradecimentos:
Constança Fernandes (revisão)
António e João Paixim (proprietários agrícolas)