Ruralidades – Adegar
Terminadas as vindimas é tempo de adegar. Aqui está mais um episódio da rubrica 'Ruralidades', desta vez fomos até aos Vinhos Franco ver como estão os trabalhos na adega. Ruralidades é uma rubrica do Jornal de Cá com enófilo Hélder Anacleto
Por Hélder Anacleto
Agora que terminaram as vindimas, o trabalho na adega continua, não só nos particulares, como também em toda a indústria ligada ao setor vitivinícola.
Após um ano de esforço, trabalho e resiliência, o resultado culmina com a vindima, sendo nesta fase que se começa a definir o valor e qualidade da colheita. No entanto, para que o vinho possa chegar ao consumidor, é ainda necessário proceder a diversos trabalhos na adega, que chegam a demorar semanas a fio.
Atualmente, tudo se torna mais fácil devido às novas tecnologias e equipamentos, com cada vez mais recurso a técnicos qualificados.
No tempo dos nossos antepassados, nem sempre foi assim, uma vez que, após a descarga das uvas no lagar, sempre à força de braços, era necessário proceder ao seu esmagamento.
Para essa tarefa, (a pisa), os pequenos produtores recorriam normalmente à mão de obra, grupos de homens ou de jovens, que contratavam para o serão, pois a maior parte das vezes era efetuada ao início da noite, também em alguns casos se recorria à ajuda de familiares e amigos.
A pisa durava aproximadamente quatro horas, em média, dependendo sempre do número de pessoas dentro do lagar, da capacidade deste e ainda do volume de uvas existente. Começava-se então, a girar em volta da prensa, invertendo o sentido de vez em quando, até os cachos se transformarem numa massa uniforme.
No início, esta tarefa era dolorosa, visto que os engaços dificultavam e arranhavam as pernas e os pés, sendo uma verdadeira vinoterapia.
No final, quando todo aquele volume de vinho se tornava num creme fofo, era dada a ordem do patrão… “Fora!!”. Todos saltavam do lagar e abeiravam-se da celha de madeira previamente cheia com água do poço, para a lavagem das pernas, secando as mesmas com uma saca de serapilheira, já que o uso das toalhas, quando existiam, era destinado às casas de banho.
A massa ficava, entretanto, a repousar e rapidamente começava a ferver, ouvindo-se um som característico, era o borbulhar da massa a ganhar vida! A partir deste momento, a atenção do proprietário era redobrada, chegando inclusive a inspecionar o lagar durante a noite para ter noção de que esta se encontrava viva, esperando assim a sua paragem (ou como diziam “chegar ao zero”), para que pudessem encetar o trabalho da trasfega. Para tal, recorria-se a uma bomba manual, que, com o chupador enfiado na mesma celha onde antes se tinham lavado as pernas, transferia o precioso líquido para os depósitos ou tonéis.
Agora era só esperar que o tempo e os cuidados fizessem o seu trabalho, para que no São Martinho estivesse então capaz de provar.
Agradecimento especial: Vinhos Franco, Hernâni Magalhães e Constança Fernandes