Elvira Tristão
A nova presidente da concelhia do partido socialista tem vários anos de experiência na vida politica local. Chega à liderança com naturalidade e não está nos seus planos ser presidente da Câmara mas lembra que o futuro a Deus pertence
É a primeira mulher a liderar a estrutura concelhia do Partido Socialista, no Cartaxo. Está a arrumar a “casa” dando continuidade a um projeto político que já abraçava e em que acredita. Garante não ter ambição de vir a ser presidente da Câmara mas afirma que “quem anda à chuva molha-se”. De uma coisa deixa certezas: está disponível para dar o corpo às balas e não se furta em assumir as responsabilidades do lugar que ocupa.
O que se passa com o PS Cartaxo? Porque é que os líderes concelhios do PS não se aguentam no cargo?
Oficialmente o PS é poder desde sempre, no que diz respeito ao exercício do poder autárquico. No entanto, eu acompanho a vida do partido desde 1995. De 95 a 2005 a vida do partido acontecia com alguma naturalidade, sem situações disruptivas, o que não significava que não houvesse divergências de opinião, de projeto político. E tanto que assim foi que em 2005 essas divergências começaram a acentuar-se, quer no projeto autárquico, quer no que diz respeito à própria vida do partido. Recordo que em 2005 eu pertencia já a uma corrente de opinião que divergia da corrente de opinião que estava do lado do poder autárquico. O tempo veio dar-me razão. Isto para dizer que, entre 2010 e 2013, efetivamente o PS era o partido do poder mas que se encontrava, numa situação de contra poder na medida em que divergíamos do projeto político liderado por Paulo Caldas.
Entretanto houve eleições e esse cenário alterou-se.
Em 2013 passámos a ser poder. E passámos a ser poder em circunstâncias que o PS nunca tinha vivido no concelho do Cartaxo que era a circunstância de ter que gerar e contribuir para equilíbrios, uma vez que nos encontramos numa situação de maioria relativa. São fenómenos novos com os quais provavelmente tivemos que fazer uma aprendizagem e dessa aprendizagem resultaram alguns episódios que aconteceram no PS como tem acontecido noutros partidos. Recordo que também o PSD teve uma mudança de liderança por demissão do líder concelhio.
O que transparece no PS é que há divergências, ao contrário do que se percebe no PSD.
Também transparece mais porque está numa situação de poder e mais exposto ao escrutínio público. Também somos mais, é muito natural que se notem mais essas, diferenças.
Já foi vereadora no tempo de Paulo Caldas…
Sim, saí no final do único mandato que exerci. Não terminei o mandato. Saí porque não acreditava no projeto e não concordava com a liderança e não acreditava na forma como Paulo Caldas estava a prever a gestão do mandato de 2005/2009. Tinha algumas reservas e, portanto, entendi sair por que estou nas coisas quando acredito nelas e quando não acredito afasto-me.
Consegue conciliar a sua vida privada com as exigências da liderança?
Há momentos em que é difícil, mas a este nível não há cargos a tempo inteiro. Os líderes das concelhias têm as suas vidas pessoais e profissionais. Tenho neste momento projetos de grande ambição, pessoais e profissionais, e esses não os vou largar de maneira nenhuma. Isso implica que haja uma gestão da equipa. Há funções das quais não me posso demitir, sou eu que tenho que as cumprir mas há muito trabalho que tem de ser feito pela equipa e portanto neste momento a minha preocupação é delegar funções nos elementos que escolhi para o meu secretariado.
A atuação do Partido Socialista vai mudar?
Isto não é uma rutura, é uma continuidade. Vejo isto como uma estafeta, (risos). Isto é um projeto de equipa. De uma equipa na qual me encontrava em terceiro lugar, situação que foi por mim acordada quando se constituíram as listas, aliás o terceiro lugar é o lugar tradicional de cumprimento das cotas femininas, e quando tive conhecimento da renúncia do meu camarada Mourão pensei que estava em terceiro lugar não só pelas cotas femininas, estou porque numa situação em que é preciso passar o testemunho eu estou cá. Teria os meus motivos pessoais para declinar esta responsabilidade mas entendi que fazê-lo era de facto reforçar a teoria, em que não acredito, que as mulheres só servem para cumprir as cotas. Portanto aceitei o desafio, não sem antes dizer aos membros da comissão política e do secretariado que estaria disposta a assumir as funções mas que, se de alguma forma houvesse alguma dúvida sobre a legitimidade da minha liderança que aí entendia que devia haver um processo eleitoral.
E acharam que havia legitimidade…
Foi uma posição unânime.
Já tem programa?
Neste momento estamos a arrumar a casa. Há sempre coisas a arrumar apesar do projeto ser o mesmo. Estamos a distribuir funções entre nós e iremos, até ao final do ano, preparar o plano anual de atividade para 2015, do qual constarão três grandes preocupações. A primeira é acompanhar as equipas do partido que foram sufragadas no último ato eleitoral. A segunda grande área de intervenção é garantir formação política e autárquica a todos aqueles que têm participado no projeto socialista; e a terceira grande área diz respeito à representação da concelhia do Cartaxo nos órgãos regionais e à atividade dos órgãos nacionais.
Pretende dar um “toque feminino” ao Partido Socialista do Cartaxo?
Eu acho que todos nós temos uma área feminina e uma masculina. A grande diferença entre os homens e as mulheres é que as mulheres nunca tiveram problemas em assumir as duas. Os homens, por uma questão cultural, ou de hormonas, insistem na sua componente masculina. Não pretendo imitar os homens por estar a liderar a concelhia de um partido político. Portanto, se isso significa dar um toque feminino à liderança, faz parte. É da vida.
Porque entrou para a política?
Para mim a política sempre fez parte da dimensão humana. Irrito-me quando ouço dizer “eu não sou político”. A política faz parte da nossa vida a partir do momento em que fazemos juízos.
Alguma vez pensou chegar à liderança. É que assumiu com muita naturalidade.
Em 2013 tinha dito que não tinha condições pessoais, porque tinha de concluir a minha tese de doutoramento. Agora, nos dois dias que se seguiram à renúncia do António Mourão pensei no aforismo “quem anda à chuva molha-se” e se eu dissesse que não, estava a corroborar a narrativa de que as mulheres só servem para ocupar cotas. Portanto aceitei.
Está preparada para a exposição que a liderança lhe traz?
Sempre dei o corpo às balas, mesmo quando não era líder. Portanto cá estarei.
Quer ser presidente da Câmara?
De maneira nenhuma. Não está nos meus objetivos. Bem, não digo “desta água não beberei”. Diz o povo que “o futuro a Deus pertence”. Não tenho qualquer ambição de voltar a fazer parte de qualquer executivo camarário. Não declinando responsabilidades nessa matéria, não faz parte das minhas ambições.
Mas como líder é a candidata do partido…
Não necessariamente.
Vê-se a apoiar outro candidato?
Perfeitamente. Não estou a liderar o partido com o objetivo de vir a ocupar este ou aquele lugar.
E nas estruturas nacionais do partido?
Não excluo essa possibilidade, mas não faz parte da minha maneira de estar na política pôr-me em bicos de pés.
Luís Rosa-Mendes