Opinião de José Barreto
Neste debate já se percebeu que há uma diferença de posição clara entre aqueles que, como o PCP, rejeitam que as orientações estratégicas do País sejam condicionadas pelas amarras de Bruxelas e aqueles que convergem na submissão do País a esses ditames, por muito que queiram encontrar pretextos para fingir diferenças.
Esta é a questão de fundo, que está subjacente à apresentação deste como de todos os outros programas de estabilidade. É que este documento não passa de um pró-forma para cumprir o calendário da burocracia europeia, para agradar a Bruxelas e, assim, condicionar opções para o futuro. E aí, PS, PSD, CDS e os deputados únicos dos partidos mais reacionários convergem nessa submissão.
De que vale estarmos a discutir um documento com previsões a cinco anos, num contexto com tanta incerteza, quando o que se impõe é concretizar as medidas que estão no Orçamento e que precisam de concretização urgente para dar resposta aos problemas dos trabalhadores, das famílias, das empresas, dos serviços públicos?
De que vale agradar aos tecnocratas de Bruxelas, quando são evidentes as debilidades decorrentes de uma excessiva dependência externa, particularmente no que diz respeito às vacinas?
Estamos amarrados a uma estratégia falhada, a que nem as potências dirigentes da União Europeia se submetem, em vez de diversificarmos a aquisição de vacinas e apostarmos na produção de vacinas, para agora e para o futuro!
De que valem os anúncios, quando o investimento público é tantas vezes bloqueado pela falta de recursos na administração pública, ou pelo sufoco do Ministério das Finanças, e mesmo pelos riscos de atrasos na aprovação do PRR, do qual depende quase tudo o que se prevê investir?
De que vale aceitar o espartilho orçamental, mesmo quando as regras estão suspensas?
Porque é que o Governo continua a ter como pedra de toque a obsessão pelo défice, quando o que era preciso era canalizar toda a margem para a resposta aos problemas do País?
Uma aposta na produção nacional, substituindo importações em bens estratégicos, porque só produzindo pode um país ser verdadeiramente soberano e próspero.
Uma valorização do trabalho, com o aumento dos salários, dos direitos, do combate à precariedade, para que deixemos um modelo económico baseado em baixos salários.
Uma aposta no investimento público, que sirva para melhorar os serviços públicos, desde logo na escola pública e no SNS, e que sirva também para impulsionar o investimento privado.
A recuperação do controlo público de empresas e sectores estratégicos, como a banca, as telecomunicações, a energia e os transportes, para colocar estes sectores ao serviço de uma estratégia nacional de desenvolvimento.
Esta alternativa não se compagina com o condicionamento das opções de fundo do país às imposições da União Europeia e do Euro. Esta alternativa exige respostas urgentes aos problemas que hoje se manifestam de forma gravíssima, mas também aponta à resolução das causas de fundo desses problemas, das debilidades e dependências para que o País foi sendo empurrado por sucessivos governos.
*Artigo publicado na edição de maio do Jornal de Cá.