Tocar os sinos a rebate

Opinião de Frederico Guedes

O meu saudoso pai contava-me vezes sem conta que quando me perguntou aos cinco anos de idade se eu queria ser sócio do Benfica, respondi prontamente de Lisboa ??! eu sou do Cartaxo !!… A partir daí, habituei-me desde miúdo a ir ver os jogos do clube da minha terra, muitas vezes exagerando, pois ia para trás da baliza adversária, no Campo das Pratas, onde havia um enorme eucalipto, fazendo a vida negra aos guarda-redes das equipas adversárias com as sementes desta imponente árvore, cujos ramos chegaram a ultrapassar as linhas limítrofes deste campo de jogos.
Recordo-me das enchentes em dia de jogos, onde na altura verificava-se muitas senhoras dentro dos carros fazendo o seu tricô, aguardando pelo fim do jogo, e da vivacidade dos intervalos dos mesmos, onde o bar do clube, o homem das castanhas e a senhora que vendia bolos não tinham mãos a medir.
Aquele campo de jogos, com o decorrer dos anos, tem já uma “bíblia” de histórias com festejos de campeões, tanto na equipa sénior como em todos os escalões de formação, tantos que é o Clube que possui mais títulos oficiais no âmbito da Associação de Futebol de Santarém.
Quando fui convidado para participar na sua direção não hesitei, pois sempre achei no mínimo estranho como uma coletividade com mais de 80 anos de história não tinha qualquer património, sabendo que em qualquer localidade deste país os seus clubes mais representativos têm, no mínimo, uma parcela de terreno oferecida por um benemérito ou pelo seu poder político, seja por uma importante Câmara Municipal ou por uma pequena Junta de Freguesia.
Ao longo dos anos, sempre se assistiu a uma decrépita inoperância do nosso poder local em resolver definitivamente esta ausência de qualquer bem patrimonial; pelo contrário, ainda prejudicaram o clube, com decisões que, no seu constante adiamento, acabaram por se traduzir num problema com contornos ridículos de exigência de indemnizações por parte de um senhorio com o qual o clube tinha sempre honrado os seus compromissos, ou seja, com o pagamento das rendas a tempo e horas.
No primeiro mandato da câmara investiu-se no complexo da Quinta das Pratas, conseguindo a direção do clube na altura investido num terreno na zona industrial, chegando a realizar a drenagem do mesmo para relva e havendo uma pré-inauguração, com o colocar de uma pedra simbólica da obra. Recordo-me, como sócio, de ter contribuído monetariamente para esse futuro e plausível campo de jogos finalmente para a posse do clube. Porém, mais um revés, no mandato seguinte de Conde Rodrigues, decide-se a construção de um megalómano Estádio Municipal, em que o clube teria de desistir da sua obra para não haver duas candidaturas simultâneas a fundos comunitários e tendo como compensação o usofruto do mesmo naquela infraestrutura desportiva.
Em qualquer localidade apelava-se ao bairrismo, tocavam-se os sinos a rebate, e todos os atletas, dirigentes e sócios apresentavam-se com uma moção de protesto numa próxima reunião camarária, alegando o estatuto de utilidade pública, até chegar a uma Assembleia da República e chamar à justiça quem causou tamanha irresponsabilidade ao clube, faltando ao respeito a todos os diretores que se dedicaram com tempo e sacrifício nas obras e nos melhoramentos, naquela que foi sempre a sua principal Infraestrutura.
Como esta triste telenovela, infelizmente, não se passa em mais lado nenhum senão na minha terra, ficarei a aguardar o seu epilogo final, com expectativa e atentamente, porque sou cartaxeiro com muito orgulho, mesmo de cá.

Isuvol
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