Por cada ano que passa, é cada vez mais difícil de suportar o frio. Um frio húmido, que enche as janelas com gotas de água de transpiração e paredes cinzentas com pontos negros de bolor. Cada vez mais agasalhado, com polares vestidos e meias grossas para não gelar os pés, sendo que a única parte do corpo que está gelada é a ponta do nariz, em pingo, como um focinho molhado de um cão.
Lareira acesa, edredões e cobertores nos sofás e camas, controlando sempre a temperatura pela vapor de água que emana da respiração. Os meus putos acham piada, sempre a quererem fumar o frio que o vapor lhes dá e a tentarem desenhar figuras à medida que o fumo é expelido pela boca, como desenhos animados.
Quando olham pelas notícias da televisão, perguntam sempre quando é que vamos à Serra da Estrela ver a neve. Querem tocar no gelo, fazer bonecos de neve, rebolar e fazer “sku”. Eu tento adiar, dizendo que nesta altura é perigoso, que podemos ficar presos num nevão e que a viagem pode ser perigosa.
Faz-me lembrar as viagens pela altura da Páscoa à terra dos meus avós, serpenteadas de Seia à Torre, com encostas pintadas de pequenos bocados de neve como algodão, até chegar ao manto branco da Torre.
Tento descrever este cenário idílico aos miúdos, dizendo que já nevou no Cartaxo há 10 anos, mais propriamente no dia 29 de janeiro de 2006, num belo domingo. Que nevou na nossa casa, ficando o telhado e as terras brancas, o nosso saudoso cão Max, com o seu pelo preto tapado com flocos de neve e a não perceber o que que estava a acontecer. Dou por mim de pijama e robe cinzento na rua, a tirar fotografias e a sentir a neve da Serra da Estrela nas minhas mãos. E digo aos miúdos, é este ano que vamos à Serra, ver o topo do mundo.