Enquanto no país e no mundo acontecem milhões de coisas, no concelho acontecem festas, estátuas que mudam de sítio e, em abono da verdade, também muitas outras coisas que, agora, para o caso, não interessam nada. É verdade que muitas das coisas que acontecem no mundo também não interessam nada e sobre muitas das que interessam fazem-nos passar “como cão por vinha vindimada” e nem chegamos a dar por elas, enquanto passamos o tempo a ouvir falar de Barbies e Oppenheimers, da pré-epoca e de transferências concretizadas, goradas ou inventadas, de jornadas e de papas e tolos.
Enquanto no mundo as temperaturas do ar, dos mares e dos oceanos batem recordes e se elevam a valores de filme apocalíptico; por cá mantêm-se aceitáveis e como dizem os meteorologistas “dentro dos valores para a época”, apenas e só pela ação do Anticiclone dos Açores.
Na realidade, se fôssemos um país minimamente agradecido e com as prioridades certas, há muito que já havia em todas as cidades, vilas e aldeias de Portugal uma rua, uma praça ou mesmo uma avenida chamada “do Anticiclone dos Açores”. Era mais do que merecido.
Em julho, e tendo sido efetuado a temperaturas razoáveis – “Excelente serviço de climatização abrilhantado pelo Anticiclone dos Açores” –, mudou-se o Marcelino Mesquita de sítio, tendo o “homem” voltado mais ao menos ao seu lugar e sentido originais: quase no centro da Praça 15 de Dezembro e de costas voltadas para a Câmara Municipal, mas de frente para a Praça, para as ruas, os prédios e as pessoas que são ou estão no Cartaxo. Felizmente o dramaturgo de chapéu à cowboy já não tem de passar o tempo dividido entre os pombos e a fachada do edifício-sede do Município, que só o artístico painel de azulejos disfarça a deselegância e desproporção.
Com tudo o que se passa no país e no mundo, parece coisa pouca levar uma estátua uns metros mais para a frente e virá-la, mas no caso não é. Talvez histórico seja um exagero, mas, de facto, foi uma decisão correta, justificada e consequente e não só não é um gesto meramente simbólico, antes vai ao encontro do que as pessoas queriam e sentiam ser correto, como com as intervenções que ali têm sido feitas não só o Marcelino Mesquita recuperou importância e relevo, como todo aquele espaço público ganhou outra dignidade, apresentação e utilidade, mitigando o enorme erro histórico cometido há cerca de 10 anos de descaracterizar o centro da cidade, arrasando o jardim existente e substituindo-o por um enorme e estéril empedrado.
Volto ao mundo – ao mundo que não tem um super-herói real como o nosso Anticiclone – para acabar com uma fotografia que contém dois factos históricos, um trágico e outro igualmente trágico que ajuda a explicar o primeiro. A fotografia: ao centro um enorme termómetro a marcar uma temperatura máxima que é um recorde desde que há registos, 55º, a ladeá-lo duas pessoas a apontar para o número registado, de sorrisos abertos, satisfeitas e orgulhosas e uma terceira pessoa a fotografá-las com o seu telemóvel. Como se fossem dinossáurios sorridentes a tirar uma selfie com um enorme meteorito em fundo.