Opinião de João Fróis
Vivemos tempos conturbados. Poucas dúvidas ainda restam quanto às incertezas várias que assaltam este mundo em ebulição civilizacional.
Muito se fala dos impactos que a digitalização vai assumindo no quotidiano de cada vez mais adolescentes e jovens adultos e do que essa dependência pode vir a significar em vários campos, desde a socialização, vida conjugal, personalidade, maturidade e independência.
Um estudo recente feito nos EUA, revela um fenómeno que tem vindo a aumentar a cada ano, a inatividade sexual de cada vez mais pessoas, com particular incidência nos chamados millenials, ou seja, todos os nascidos após 1980. Nesta faixa etária, a percentagem de inativos sexuais chega a uns preocupantes 28%, onde grande parte não tem qualquer ato sexual durante um ano. A tendência afeta mais os homens mas também está a crescer entre as mulheres. As gerações nascidas nos anos 60 e 70 do século XX continuam mais ativas sexualmente.
As leituras que se podem fazer são múltiplas, mas o mesmo estudo avança com alguns fatores que podem ajudar a explicar o fenómeno, como o facto de os jovens saírem cada vez mais tarde da casa dos pais e terem inúmeras distrações digitais onde ocupam grande parte do seu tempo.
Os tempos mudam e com eles as relações sociais e as formas de ir comunicando e mantendo as ligações de amizade e conhecimento. Este novo milénio trouxe um Boom tecnológico sem igual e proporcionou o acesso fácil, intuitivo e barato ao melhor da informação que é produzida à escala global e que debita milhares de conteúdos a cada minuto que passa, na imensa rede mundial de dados que é partilhada e cultivada por cada um de nós. Nunca foi tão fácil saber o que está a acontecer na China ou na Papua Nova Guiné, pois as plataformas online mostram em direto o que milhares de pessoas fazem nessa mesma hora, seja onde for. O planeta ficou inusitadamente pequeno e cada smartphone permite que o seu utilizador seja um jornalista/ativista em potência, mostrando o que lhe aprouver, seja útil ou não. O lado negro das potencialidades do online foi demonstrada no ataque bárbaro perpetrado na Nova Zelândia onde o seu autor usou o direto para dar o recado que pretendia ao mundo!
Mas ainda ninguém consegue mensurar todos os impactos que as dependências que o mundo digital vai criando, irão ter nas vidas dos milhões de jovens nascidos no seu reinado, vulgo pós mundialização do Facebook em 2006.
Mas uma coisa é certa, os mais jovens há muito que não fazem vida de rua, tal como os seus pais fizeram. O crescer entre iguais nas brincadeiras e jogos de rua desapareceu na década de 90 e o novo século trouxe um medo generalizado que leva os pais a temerem o rapto, a violência, o desconhecido. Os jovens vivem assim ligados ao mundo, mas fechados em casa. E a socialização sofre assim um abalo tremendo. As ligações entre jovens sucedem-se a um ritmo vertiginoso mas nas redes sociais, de modo virtual e frio. Quando se juntam, não raras vezes, não sabem o que fazer ou dizer sem o smartphone à mão.
Ora, o sexo faz parte das necessidades básicas do ser humano. Muito se disse e escreveu sobre as virtudes e defeitos do sexo, mas a verdade é que é algo natural e indissociável da normal e saudável vivência e crescimento de cada indivíduo. O mais preocupante é perceber que mais do que a falta de acesso o que esse estudo revela é um desinteresse crescente sobre a prática sexual, facilmente trocada por estímulos sensoriais ligados a ecrãs e sons.
Pode estar a nascer uma geração assexuada ou em que a libido seja atirada para uma gaveta onde se guardam coisas inúteis. Mas esta realidade não será transversal em todo o planeta, pelo que aqueles que mais singrarem na manutenção dos “velhos” hábitos irão colher frutos, mais não seja por estarem mais capazes e apresentados social e emocionalmente e também porque irão, com elevado grau de probabilidade, multiplicar-se enquanto os outros definham.
Os cenários são preocupantes, mas os próximos anos dirão quais os caminhos que as relações interpessoais irão conhecer e quais os impactos que os mesmos terão no futuro desta civilização.
Nos EUA, há largos anos, houve uma música que se intitulava “Vídeo killed the radio star”, anunciando a supremacia do visual e da televisão sobre a rádio. Agora, bem podemos estar a presenciar o fenómeno do “virtual and digital killed the sexual life”.