O cerco europeu
"Se dúvidas houvesse dos interesses que movem as nações mais poderosas, a sua ausência na COP30 mostra sem filtros que as questões climáticas não são de todo prioridades. Fica evidente que o legado ético para as gerações vindouras está a morrer e com ele o futuro da civilização". Por João Fróis
Com as duas grandes guerras a destroçarem a velha europa, o século XX trouxe a ascensão dos EUA, a lenta afirmação da China e a posterior desintegração da URSS. O novo século e milénio trouxeram a vertigem tecnológica e a assunção definitiva da Ásia como o centro económico planetário e o ressurgimento da velha Rússia imperial e militarizada. Enquanto o mundo assiste à eternização da guerra na Ucrânia, ao arrastamento do conflito israelo-árabe e às sanguinárias batalhas no Sudão e Nigéria, mais de uma centena de países fazem-se representar na COP30, cimeira climática a decorrer em Belém do Pará, na Amazónia, para tentarem travar o aumento das emissões nocivas na atmosfera. No entanto este megaevento de duas semanas está ferido de morte à nascença com a ausência dos três maiores poluidores mundiais, a China, responsável por 29% das emissões, os EUA, geradores de 11% e a Índia, emissora de 8%. Estes gigantes económicos e populacionais representam metade da poluição gasosa que causa o imparável e altamente nocivo efeito de estufa, responsável pelo aquecimento e acidificação dos oceanos e destruição dos habitats marinhos e continentais de modo irreversível.
Restam assim a velha europa, representada pela União dos 27 países membros e que é responsável por cerca de 6% das emissões mundiais e as denominadas economias emergentes ou em desenvolvimento e que carecem de apoios dos países mais ricos para se modernizarem e procederem às transformações estruturais que lhes permitam evoluir e baixar os seus níveis de poluição. O esforço é na ordem dos biliões de dólares a cada ano, mas a temperatura não cessa de aumentar e a marca de 1,5 graus célsios fixados na cimeira de Paris já são, infelizmente, uma miragem.
A europa está emparedada entre os EUA, imersos numa complexa agenda interna às mãos das polémicas trumpistas e às suas guerras comerciais com o bloco asiático, fortemente industrializado e a ditar as regras da nova economia digital e robótica e a dominar em toda a escala os destinos económicos e financeiros deste mundo à beira do abismo climático. A hipocrisia norte-americana, o cinismo chinês e o boom indiano amordaçam a humanidade aos desvarios do poder, à insanidade do lucro incessante e à utopia do crescimento económico, paradoxos assustadores num mundo com recursos finitos e cada vez mais limitados.
Se dúvidas houvesse dos interesses que movem as nações mais poderosas, a sua ausência na COP30 mostra sem filtros que as questões climáticas não são de todo prioridades. Fica evidente que o legado ético para as gerações vindouras está a morrer e com ele o futuro da civilização. A obsessão é dominar o tempo presente e ficar na história. Só que poderemos estar no seu derradeiro capítulo da nossa passagem pelo planeta. E mesmo com todos os sinais da decadência dos ecossistemas e com eles das nossas hipóteses de sobrevivência, não se vislumbram mudanças significativas que consigam inverter este rumo suicidário da humanidade. A velha europa ficou a falar sozinha, para os que ainda contam com ela, mas cada vez mais afastada dos que verdadeiramente mandam nos destinos do mundo. A COP será a capitulação?









