Após termos vividos os meses de agosto dos dois últimos anos como intermitências de uma pandemia – se bem se lembram, a Covid-19 também tirou férias nos meses de julho e agosto de 2020 e 2021 e, apesar de várias limitações e constrangimentos, esses meses foram uma espécie de intervalo em que sabíamos que iriamos continuar a (vi)ver o “filme”, mas em que nos foi permitido sair da sala e desanuviar um bocado –, este ano não só não voltámos a meses de férias tradicionais, para pausa no trabalho e nas notícias do resto do ano, como nos obrigam a ver um filme bem pior!
Na verdade, além da cada vez mais difícil suspensão do trabalho – as tecnologias não nos vinham ajudar a viver e a desfrutar? –, este ano voltamos à suspensão temporária da realidade que (sabemos) nos vai atropelar mais à frente. E isto está tudo de tal forma mudado e a ainda a mudar (e sempre para pior) que mesmo a suspensão já não é nada do que era: o trabalho persegue-nos e as notícias da “silly-season” são parvas como sempre, mas são pouco de época.
Pelo terceiro ano consecutivo, estas tornam a ser férias “especiais” e pior (!) mais do que uma pausa, um hiato, um intervalo de um filme em que, melhor ou pior, já vamos percebendo as (outras) personagens, o argumento e a dinâmica da coisa, este ano – não quero ser pessimista, mas não consigo não ser –, este ano, dizia, além do regresso de mais uma temporada da Pandemia, com pouca audiência e pouca ou nenhum interesse e relevância pública; temos a continuação da Guerra na Ucrânia – Slava Ukraini! Glória à Ucrânia! –; temos a imposição (outra vez a Rússia com papel principal, porque favorece os escroques que a governam – bem o Pedro Abrunhosa a chamar os bois pelos nomes) da série dramática Inflação, Empobrecimento e Perda de Qualidade de Vida na Europa; temos ainda uma série que se passa no Pacifico (potencialmente, cada vez menos) com a China, os EUA e Taiwan nos papeis principais; temos séries menores, mas com orçamentos e possibilidade de desastres maiores, de desestabilização de países em vários continentes, pela escassez de alimentos e matérias primas, pela carestia e limitação de acesso a bens essenciais e pelo acirrar (renovando-os) de velhos conflitos e rivalidades.
Depois das férias vão ser dados mais passos para a nova (des)ordem mundial, para o programado e ordenado caos que favorece as autocracias, as tiranias e o enfraquecimento das democracias, dos direitos humanos e da igualdade entre pessoas, entre povos, entre países.
“Primeiro de agosto, primeiro de inverno”.
Artigo publicado na edição impressa do Jornal de Cá de agosto