Como foi o tempo de escola dos nossos avós? E porque hoje se inscrevem nas universidades seniores? Com o início do calendário escolar, o regresso às aulas para muitos significa o reencontro de amigos mas para outros jovens seniores voltar à escola representa uma mudança na sua vida, uma oportunidade de aprender o que na sua infância lhe foi roubado. Voltar a ser caloiro e viver novas praxes é um direito de cidadania na formação do adulto. Quer voltar a estudar? Foi com base em conversas informais num lar de idosos que partilho as suas vivências sobre o tema educação.
Escreviam na ardósia e o manual passava de irmão para irmão. O ensino era exigente e tinham de saber a tabuada de cor. Cantavam o hino nacional e rezavam todos dias. A mala era feita de sarapilheira mas os mais abastados levavam uma de cabedal. Havia muito respeito pela professora e todos temiam pela menina dos cinco olhos.
Ao assistir ao noticiário da uma da tarde sobre o primeiro dia de aulas no país, a conversa flui naturalmente com a Sra. N., de 87 anos. Ela confidencia-me que: “ a matéria que sempre gostei foi de história e talvez por influência da minha avó que me obrigava a memorizar factos que não vinham nos livros, como o rei D. Diniz, que ao mandar plantar o Pinhal de Leiria deu um grande impulso aos descobrimentos…” e que tratava a sua professora: “… com muito respeito e prazer e todos nós procurávamos não a desiludir”. Entretanto aproxima-se outro idoso que me afirma: “Puxões de orelhas, bofetadas e até mesmo réguadas eram para mim a praxe de todo o ano e ficava sempre à janela com orelhas de burro“. Confesso-lhes que fico descansada por estas práticas já não existirem, porque palmada não e pedagogia.
Recordo-me que há três anos, uma idosa de 88 anos, manifestou-me que a maior ambição que tinha antes de morrer era aprender a escrever o seu nome. Segreda-me que chegou a levar bofetadas porque insistia em escrever com a mão esquerda e como não conseguiu concluir o ensino primário o pai mandou-a mais cedo para a lide doméstica e para o campo. Jamais a vou esquecer a forma como pegava no lápis e com a sua persistência e dedicação cumpriu o seu desejo. Apenas com cinco letras escreveu seu nome: Alice.
Tenho o prazer de conhecer um simpático idoso, de 80 anos, que fez parte de uma tuna sénior e que me ensinou que há sempre tempo para aprender. Ele é o exemplo que não devemos desperdiçar novas aprendizagens. Incentivei-o aderir às novas tecnologias e fazer a sua biografia, a sua história de vida. Todos dias pela manhã toca a sua guitarra, e como um peixe que não vive fora de água ele também para viver precisa de respirar música. A prática de um instrumento musical é crucial na sua vida, permitindo ser mais criativo e feliz.
Muitas crianças do passado foram obrigadas a terminar a meio o seu percurso escolar, mesmo contrariadas aceitavam o seu abandono como sobrevivência familiar. Não tinham alternativas, mas hoje essas crianças são homens maduros e tomam consciência crítica que é importante a formação ao longo da vida.
Sabem que não sou professora mas o papel do Assistente Social em atuação com este grupo etário é incentivar, encorajar e criar condições aos idosos para que possam transformar um sonho em oportunidade. Vamos valorizar os interesses e as expectativas de cada utente, cada um tem a sua particularidade.
Em suma, penso que voltar a ser caloiro aos 90 anos é continuar a fazer uma ginástica cerebral. É voltar a sentar nos bancos de escola onde existe um espaço de valorização pessoal e social. Participe, o desafio está no momento.