Dia triste, muito triste. Voltei ao Cartaxo. Morreu a minha irmã. Pouco mais velha, partilhámos infância e juventude. Sempre em contacto, éramos as filhas da Profª Maria Helena e do Prof. Herculano, de quem muitos cartaxeiros foram alunos e de quem falam com saudade.
Numa rua desolada, ponta acima, ponta abaixo, prédios por pintar e outros abandonados, cheguei à Igreja. Era cedo, fui à rua Batalhoz. Pior. Pouco resta. Muitas lojas fechadas, pouca gente. Atravessei o largo em frente à Câmara cujo sentido não percebi. Vazio, o que outrora foi o centro da terra.
Não sou saudosista. Gosto de ver os lugares do passado modernos e confortáveis, vivos e transformados. Mas não assim. Mudar para pior não está certo.
No espaço escuro e frio que, na cidade, aguarda quem deixa esta vida, sentei-me, num sofá de plástico. Não, numa cadeira de fórmica cuja existência já desapareceu, há muito, dos cafés mais modestos.
Fiz a experiência do Hotel da Quinta das Pratas. Um belo espaço. Nem TV, nem wi-fi a funcionar. A partir da meia noite, deixaram de responder da recepção. Pedi o livro de reclamações. Não o encontraram. “A gerência”, disseram. Qual África subsaariana, qual quê! Cartaxo. “Não há terra como o Cartaxo, não há, no coração do Ribatejo, lá está…”, insistia uma voz dentro de mim.
Da Assembleia Municipal a que presidi e do PS, nem um gesto. Onde andam, camaradas?
A amizade de familiares, amigos e vizinhos aqueceu-me o coração. Surpresas, quem vinha falar da “Leninha”, sem eu saber quem eram, “aluna da sua mãezinha” ou “do seu paizinho”, pois claro. Surpresas, o reencontro com amigas e amigos de todas as idades.
E o sol. Muito sol frio.
Despedi-me da minha irmã.
Dia triste. Desculpa, minha terra, por não ter feito mais por ti.
Vamos embora e tu ficas, espaço distorcido e mal amado. Não merecias.
Crónica publicada na edição de fevereiro do Jornal de Cá.