As eleições são de uma importância fulcral para as sociedades modernas, pelo que não têm apenas de funcionar, como as pessoas têm de acreditar que funcionam.
Após cada ato eleitoral, lembro-me sempre das cidadãs e cidadãos que o tornaram possível. Essa multidão anónima que ali está, um dia inteiro, revezando-se, conversando e assegurando que tudo corre sobre rodas. Do apoio a quem tem mais dificuldade, com a ordem na sala, ao lidar com as tensões das contagens, acontece sempre qualquer coisa de diferente.
Esse trabalho é, atualmente, remunerado, mas lembro-me daquelas em que participei e que não eram. O meu pai ensinou-me que era um dos preços a pagar pela democracia. E eram uma seca, na altura. Mas são essas pessoas que garantem que confiemos no ato e no seus resultados, independentemente das nossas escolhas. Por isso, quanto mais que não seja, a eles o meu obrigado público.
Posto isto, porque é que ainda usamos este sistema, pouco eficiente, chato e demorado? Pode parecer um bocado incompreensível que, numa altura que tudo é feito online (recebi hoje a minha “fatura do IMI para pagar e irei fazê-lo exclusivamente com recurso a meios eletrónicos), não se consiga obter os desejos da população através da utilização de meios eletrónicos.
Aparentemente as vantagens são tremendas: mobilidade (“vote onde quiser”); facilidade para o utilizador (“click”); resultados e contagens mais rápidas (em tempo real); menos dependência de meios humanos e logísticos (mesas de voto e todo o aparato que rodeia uma eleição, para além dos custos efetivos de dinheiro – 8,5 M€); melhor eficiência do processo eleitoral; previsível diminuição da abstenção.
Qual é que é o problema, então? É que o voto tem de ser secreto. E, ao contrário das transações bancárias e similares, que temos com n entidades, não tem de ser apenas confidencial, i.e., apenas as partes envolvidas sabem do conteúdo da comunicação.
Não. O voto tem de ser secreto mas não pode ficar ligado a quem votou, ao indivíduo. O voto teria de ser contabilizado e esquecido, apagado, teriam de desaparecer todas as ligações a quem o tinha efetuado. E isso, a ser possível, abre a porta a um conjunto muito grande de utilizações, mais ou menos indesejáveis (o mais ou menos, dependendo de que lado se está).