O lado Bom do SNS

Por Elvira Tristão

Quero falar-vos das pessoas extraordinárias e resilientes que tem feito do nosso SNS um dos melhores do mundo, apesar das notícias, das queixas e dos números. Independentemente das políticas e dos orçamentos, são os profissionais de saúde que conferem qualidade aos nossos centros de saúde e hospitais. E tenho conhecido e testemunhado os seus notáveis desempenhos, com especial atenção à empatia e à atenção na procura da resposta (felizmente sem grande experiência em situações clínicas complexas). Porém não é este o panorama que nos mostra a comunicação social.

Neste verão temos sido bombardeados com a crise do SNS. São as urgências fechadas por falta de médicos especialistas, são as listas de espera para as consultas de especialidade ou para as cirurgias, são os milhares de utentes sem médico de família, são as queixas dos profissionais de saúde entre a exaustão e as remunerações baixas, é a fuga dos médicos para o privado ou para a aposentação. Tudo isto é verdade e factual.

Mas também é verdade que   a evolução das consultas em cuidados de saúde primários tem vindo a aumentar. De acordo com o relatório do Conselho de Finanças Públicas de 2023– Evolução do Desempenho do Serviço Nacional de Saúde em 2022 -, aumentaram de 29 865 consultas médicas em 2014 para 34 544 em 2022; os rastreios e acompanhamento de doentes oncológicos aumentaram face a 2019; as consultas médicas hospitalares têm vindo a aumentar; aumentaram também as intervenções cirúrgicas programadas e as cirurgias urgentes. Não obstante este aumento de respostas assistenciais do SNS, em 2022 aumentou o tempo de espera para consulta hospitalar, tendo-se também deteriorado a capacidade de resposta da atividade cirúrgica; também o número de utentes sem médico de família tem vindo a aumentar.

De acordo com o mesmo relatório, a despesa no SNS, em 2014, representou 9,9% da despesa pública (5,1% do PIB), e em 2022 representou 12,3% da despesa pública (5,5% do PIB). Diz também o relatório que o aumento da despesa é transversal a outros países da Europa quer devido ao envelhecimento da população quer à introdução da inovação tecnológica na área dos cuidados de saúde.

Pelo exposto, pretendo demonstrar que a verdade não é uma perspetiva monolítica que interessa defender politicamente conforme se têm responsabilidades executivas ou se está na oposição. A verdade é complexa e se, por um lado, o aumento do investimento no SNS tem ocorrido, nos últimos anos, também é verdade que os recursos não são infinitos e a evolução das sociedades tem conduzido a situações de crescente carência. Pelo que o importante é fazer uma administração inteligente e socialmente responsável, com as pessoas e para as pessoas.

E é precisamente das pessoas que vos quero falar. Das pessoas que fazem o SNS a quem estou pessoalmente grata. Nestes tempos em que as televisões têm traçado um cenário negro do SNS, tive o privilégio de testemunhar os excelentes seres humanos que temos nos nossos hospitais e centros de saúde, desde aos auxiliares de serviços gerais (responsáveis pela higienização dos espaços e equipamentos), aos assistentes técnicos de atendimento ao público e apoio aos clínicos, técnicos de diagnóstico e pessoal médico. Felizmente não foram situações de extrema gravidade, não foram sequer episódios de urgência hospitalar. No entanto, tenho a perceção de que os nossos profissionais de saúde dão o seu melhor, em situações de enorme fragilidade daqueles a quem servem e num quadro de baixas remunerações e meios insuficientes para as necessidades de resposta.

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É claro que nas unidades de saúde privadas o atendimento também é excelente e, enquanto utilizadora, não tenho razões de queixa. Tanto no público como no privado nem tudo é perfeito, mas sinto que temos um sistema de saúde de primeiro mundo. Se pensarmos, por exemplo, em países onde a saúde não é universal e pedem aos cidadãos o número da apólice de seguro antes de qualquer assistência. Em Portugal também há unidades privadas onde é necessário seguro de saúde, mas quando a resposta exige equipamentos de ponta, ou quando se esgota o plafond do seguro, são os hospitais públicos que dão resposta aos utentes, com carências, mas assistindo a todos os cidadãos.

É no SNS que se formam os médicos, desde a formação inicial à especialidade. É o SNS que mais investe em investigação clínica. É o SNS que assiste a todos, apesar da pressão das necessidades face aos meios sempre limitados. As respostas privadas são importantes, mas são complementares. E assim deverá ser se queremos continuar a ter na saúde um direito universal de cidadania, de qualidade, para todos.

E é por isto que defendo que os profissionais de saúde do SNS merecem o justo reconhecimento do seu trabalho e investimento académico e profissional. E é também por isto que tenho como uma excelente notícia a construção de um novo centro de saúde no Cartaxo, reivindicado pelo anterior executivo local e prometido pela anterior ministra da saúde, anunciado pelos atuais responsáveis autárquicos e governantes. São pessoas, independentemente da cor política, a responder às necessidades dos seus concidadãos, daqueles que merecem as melhores condições de trabalho para dar resposta às necessidades das pessoas que merecem os melhores cuidados. E este é o lado B (de Bom) do nosso serviço nacional de saúde e é para isto que também têm servido os nossos impostos.

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