Opinião de João Fróis
Em dias de eleições para o parlamento europeu, confrontados com abstenção elevada e um alheamento crescente da política, há outros números que mostram a nu que país somos hoje.
Portugal continua a envelhecer. A taxa de natalidade atual situa-se nos 8,4 nascimentos por cada mil habitantes, muito abaixo do que seria necessário para promover uma renovação natural da população. Nasce-se menos, morre-se mais tarde, beneficiando do aumento de esperança média de vida, fazendo de Portugal um país em decadência populacional, estimando-se que em 2050 sejamos apenas cerca de 8,5 milhões. Esta tendência tem vindo a agravar-se nas últimas décadas mas as políticas económicas e sociais não parecem refletir as preocupações que a todos deveriam importar, olhando para o fenómeno com uma passividade alarmante.
E se as famílias geram cada vez menos crianças há que perceber o porquê. Os números mais recentes dos rendimentos anuais ajudam a encontrar boa parte das razões de fundo que levam a que se nasça menos em Portugal. Senão vejamos. Das cerca de 5,1 milhões de famílias contabilizadas, 40% ganha menos de 10 mil euros brutos por ano. Isto significa que mensalmente dispõem de pouco mais de 600 euros líquidos para pagar as suas contas, comprar medicamentos e abastecer a dispensa. E se podemos pensar que muitas destas famílias são de idosos e reformados, olhemos para os escalões seguintes. Até rendimentos de 13500 euros mensais encontramos mais 750 mil famílias, ou seja, com rendimentos brutos abaixo dos mil euros. Significa que três milhões de famílias dispõem de menos de mil euros brutos mensais, 60% do total nacional. Nos escalões seguintes, temos cerca de 700 mil famílias até 19 mil euros brutos mensais e 630 mil até aos 27,5 mil euros, 400 mil até a uns confortáveis 40 mil euros brutos anuais e outro tanto já no patamar dos considerados ricos, até aos 100 mil ou mesmo acima.
Se atentarmos aos custos crescentes nas rendas e créditos à habitação, uma pergunta assalta-nos de imediato: como é possível viver (ou será sobreviver?) neste país, para cerca de 60% das famílias?
As taxas de endividamento mostram-nos a cru as dificuldades que tocam a tantos. Famílias a entrarem em insolvência, pedidos de ajuda à Deco, crédito mal parado e entregue a empresas coercivas de cobranças, vão manchando este país. Mas na verdade pouco se fala destes problemas sociais. A pobreza continua a ser envergonhada e escondida e não interessa aos políticos. Mas, em última análise, deveria interessar. Porque sem população não há votos nem representação institucional. Não há país sequer. Um país de esquecidos e que tem em 23% dos seus concelhos do interior mais reformados que trabalhadores. A pressão cresce na segurança social e a ruptura está anunciada há muito.
Mas continuamos a assistir a encenações políticas patéticas e sem conteúdo, a um abuso continuado do erário público por lobbies e a promessas pífias de crescimento. Podem dourar a pílula e entreter as massas com números que poucos entendem mas a realidade é indesmentível. Portugal está velho e pobre. Continuamos demasiado longe dos congéneres europeus e viver neste país continua a ser um desafio diário. A ganhar tão pouco e com impostos tão altos, dos maiores da União Europeia, como é possível pensar em ter filhos? A queda na natalidade tem aqui a maior das suas razões. Não o ver é preocupante e perigoso mas não o querer ver é muito pior, um crime lesa pátria, enquanto a há! Como dizia a canção “ai Portugal Portugal, de que estás à espera”…
*Artigo publicado na edição de junho do Jornal de Cá.